segunda-feira, 22 de julho de 2013

Liev Tolstoi - Religião

"O homem pode ignorar que tem uma religião, como pode também ignorar que tem um coração; mas sem religião e sem coração, não pode viver."
Liev Tolstoi

A Mentira e a Verdade

Só há uma certeza na mentira: ela será descoberta.

A ordem natural é o despertar para a verdade.

Marca de Nascença

Esta vai para a sessão "tosquices" interessantes deste blog: tal qual os personagens de Cloud Atlas, eu tenho uma marca de nascença em forma de cometa (na verdade, lembra muito, pois tem um corpo e uma cauda). Risos.

Não posto uma foto porque é em um lugar meio indecente! Risos.

A Profecia Celestina - As relações de trabalho e do capital

Gostaria de destacar um trecho do livro A Profecia Celestina (James Redfield) hoje, que trata sobre uma mudança das relações de trabalho e do Capital, destaco por tratar de uma mudança profunda de paradigmas:

Ele sorriu e olhou diretamente para mim.

— O Manuscrito diz que, à medida que descobrirmos mais coisas sobre a dinâmica da energia do Universo, veremos o que acontece de fato quando damos alguma coisa a alguém. Hoje, a única idéia espiritual sobre dar é o mesquinho conceito do dízimo religioso.

Desviou o olhar para o padre Sanchez,

— Como você sabe, a idéia das escrituras de cobrar dízimos é mais comumente interpretada como um preceito de dar dez por cento da renda da gente para uma igreja. A idéia por trás disso é que o que dermos será devolvido muitas vezes. Mas a Nona Visão explica que dar é na verdade um princípio de ajuda, não apenas para as igrejas, mas para todos. Quando damos, recebemos em troca, pela forma como a energia
interage no Universo. Lembre-se que, quando projetamos energia em alguém, isso cria um vazio em nós mesmos que, se estamos ligados, se enche mais uma vez. O dinheiro funciona exatamente da mesma maneira. A Nona Visão diz que assim que começarmos a dar constantemente, teremos sempre mais dinheiro entrando para dar.

"E nossas doações", prosseguiu, "devem ir para as pessoas que nos deram verdade espiritual. Quando as pessoas entram em nossas vidas na hora exata para nos dar as respostas que precisamos, devemos lhes dar dinheiro. É assim que começamos a complementar nossas rendas e aliviar as ocupações que nos limitam. Quando mais pessoas estiverem empenhadas nessa economia espiritual, começaremos uma verdadeira mudança para a cultura do próximo milênio. Teremos passado do estágio de evoluir para ocupação certa e estaremos entrando no estágio de sermos pagos por evoluirmos livremente e oferecermos nossa verdade única aos outros."

Olhei para Sanchez; ele ouvia intensamente e parecia radiante.

— Sim — ele disse a Dobson. — Vejo isso claramente. Se todos participassem, estaríamos dando e recebendo constantemente, e essa interação com outros, essa troca de informações, se tornaria o novo trabalho de todos, nossa orientação econômica. Seríamos pagos pelas pessoas que tocássemos. Essa situação permitiria então que as ajudas materiais da vida se tornassem plenamente automatizadas, porque estaríamos ocupados demais para possuir esses sistemas, ou para operá-los. Iríamos querer que a produção material fosse automatizada e administrada como um serviço público. Teríamos nossa participação nele, talvez, mas a situação nos liberaria para expandir o que já é a era de informação.

"Mas o importante para nós no momento é que agora compreendemos para onde estamos indo. Não pudemos poupar o meio ambiente, democratizar o planeta e alimentar os pobres antes porque durante muito tempo não conseguimos nos libertar do medo da escassez e de nossa necessidade de dominar, para podermos dar aos outros. Não podíamos porque não tínhamos nenhuma visão da vida que servisse de
alternativa. Agora temos!"

Coincidências do Despertar

Ontem mesmo ao escrever a crônica sobre o despertar, citei as coincidências narradas no livro A Profecia Celestina. Mesmo que as tenha menosprezado perante os sonhos que guiam o caminho, logo depois fui surpreendido ao assistir ao filme Cloud Atlas (A Viagem) baseado no romance de David Mitchell.

É de uma coincidência absurda eu dissertar sobre o despertar - não cheguei a aprofundar a questão do efeito borboleta, tampouco do aspecto da física quântica entre o um e o todo, mas pensei ao escrever - e logo em seguida, antes de dormir, assistir a um filme que aborda justamente temas que eu havia acabado de escrever. Não é acaso, tenho certeza. É uma mensagem de que devo persistir nesses sonhos, que conduzirão a um sonho coletivo sólido e de felicidade.

Estou profundamente apaixonado por essas questões filosóficas e existenciais e pretendo me aprofundar cada vez mais nelas. Mas sempre com o cuidado de não tirar os pés do chão, onde de fato agirei, e não simplesmente pensarei ou sonharei. Os sonhos precisam de realizações.

Eis o trailer do filme e a sinopse do livro Cloud Atlas (A Viagem):


"Nesta história as personagens conhecem-se e voltam a reunir-se de uma vida para a próxima. Nascem e renascem. As ações e escolhas individuais têm consequências e impactos entre si no passado, presente e futuro distante. Uma alma é moldada de assassino a herói, e um simples ato de bondade tem repercussões ao longo de séculos, tornando-se na inspiração de uma revolução. Essas mesmas histórias fazem parte de uma linha narrativa que segue uma alma humana ao longo de uma jornada de descoberta e redenção durante várias encarnações. A narração mostra como as acções de um indivíduo criam uma cadeia de acontecimentos que ecoam através dos tempos, por diferentes civilizações, fazendo com que todas as histórias de todos os indivíduos sejam na verdade apenas parte de uma narrativa muito maior que começou muito antes do surgimento do homem e que permanecerá em desenvolvimento muito depois da humanidade se extinguir."

(Excerto da Wikipedia, disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Cloud_Atlas)

domingo, 21 de julho de 2013

Médicos: as falsas polêmicas e o xis do problema (Lilian Terra)

Nota do blog: este é o texto melhor desenvolvido até agora como crítica ao Programa Mais Médicos do governo federal que já li até hoje. Honestamente, deu vontade de chorar, tamanha a satisfação da escritora em traduzir com perfeição tudo aquilo que sei e sinto sobre o tema.

Por Lilian Terra*

O anúncio do programa Mais Médicos pelo governo federal gerou uma forte reação da classe médica, que ainda não foi compreendida pela maioria. A polêmica medida foi adotada pelo governo como resposta a uma das demandas colocadas nas manifestações de junho: saúde pública de qualidade.

O programa consiste basicamente nas seguintes medidas:

• Estende o curso de medicina por mais dois anos de prestação de serviços no Sistema Único de Saúde (SUS) antes que o médico receba a licença definitiva para clinicar . A formação médica, neste caso, passa a ter oito anos de duração.

• Amplia o número de vagas de residência médica.

• Amplia o número de vagas em medicina nas universidades federais até 2017, sendo 1.815 nos cursos já existentes e 1.800 em novos cursos.

• Prevê a contratação de milhares de médicos para suprir a carência destes profissionais em vários municípios do interior do país. Isso se dará via oferta de bolsa, e não contrato de trabalho. Caso as vagas não sejam preenchidas por médicos brasileiros, serão abertas a profissionais estrangeiros sem necessidade de validação do diploma da faculdade de origem.

As entidades representativas da classe médica, como Conselho Federal de Medicina, Associação Médica Brasileira, Federação Nacional dos Médicos e Associação Brasileira de Educação Médica mostraram-se revoltadas com as medidas anunciadas, principalmente quanto à importação de médicos sem validação do diploma e à instituição de dois anos de serviço obrigatório no SUS. Com isto, deu-se início a um embate entre governo e médicos que tomou conta da imprensa e das redes sociais, sem no entanto aprofundar o debate de um tema tão caro à população.

Não há como negar os avanços do SUS nos últimos dez anos. Houve um aumento de 31,89% na cobertura do Programa de Saúde da Família (PSF), isto é, de 35,7% da população coberta em 2003 para 54,12% em 2013. Em 2003, 4.488 municípios brasileiros contavam com equipes de PSF. Hoje são 5.280 municípios, restando apenas 70 para se atingir a totalidade dos municípios do país.

O programa de Agentes Comunitários de Saúde, que nasceu em 1991 e deu origem ao PSF, foi ampliado em 13.2% e hoje atende 65,04% da população.

A mortalidade infantil atingiu as metas dos Objetivos Do Milênio – estabelecidas pela Organização das Nações Unidas (ONU) — cinco anos antes do prazo. Passamos de 23,3 mortes para cada mil crianças nascidas vivas, em 2003, para 16, já em 2010.

Houve o Lançamento do Programa Farmácia Popular, que, entre 2003 e 2005, aumentou em 75% o volume de recursos para compra e distribuição gratuita de medicamentos no SUS. Hoje existem 558 farmácias populares administradas pelo governo federal em funcionamento no país, e mais de 20 mil unidades privadas conveniadas ao programa. Desde a sua criação, o programa já beneficiou mais de 18 milhões de brasileiros. Além disso, o ministério da Saúde elevou os investimentos nos laboratórios oficiais, para produção de medicamentos, de R$ 20,7 milhões no período 2001/2002 para R$ 80 milhões em 2004.

Mas não só de avanços vive a saúde pública do Brasil. Em 2011, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil gastou US$ 477 per capita em saúde. Enquanto isso, o Uruguai investiu US$ 817,8, e a Argentina, US$ 869,4. O Reino Unido cujo sistema de saúde tem sido apresentado como referência pelo governo, gastou quase seis vezes mais: US$ 2.747.

Além disso, segundo dados do IPEA, entre 2003 e 2011 o gasto tributário em saúde cresceu de R$7 bilhões para quase R$16 bi. Ocorre que, entre 2003 e 2011, o equivalente a 26% do gasto público federal em saúde por ano, em média, deixaram de ser investidos no SUS para serem transferidos para o setor privado. Em 2011, por exemplo, metade do que o governo deixou de arrecadar de empresas ligadas à saúde deveu-se a isenções fiscais concedidas a planos de saúde — o equivalente a R$ 7,7 milhões. O crescimento dessa renúncia fiscal superou, entre 2003 e 2009, o gasto do governo em saúde pública, o que demonstra uma tendência de se privatizar a saúde no Brasil nos moldes do sistema estadunidense, considerado caro e ineficiente. Não é a toa que, entre 2003 e 2011, o faturamento do mercado dos planos de saúde quase dobrou e o lucro líquido cresceu mais de duas vezes e meia acima da inflação.

No entanto, não é este o debate que se vê na grande imprensa ou nas redes sociais. O governo sabiamente aproveitou a imagem do médico mercantilista e desumano que grande parte da população tem – e a tem porque de fato existem médicos assim – e passou a explorar o médico como o responsável pela falência do SUS. O que a população não tem enxergado, porque não tem acesso a esse tipo de informação, é que quem trabalha pelo SUS, hoje, o faz mais por idealismo que por dinheiro, porque recebe muito menos que no setor privado (que também explora, diga-se de passagem). Portanto, os médicos mais humanos que o ministro da saúde pretende formar já existem, e já são empregados do governo. O que eles desejam são condições de trabalho dignas. Muito do que uma equipe de saúde do SUS faz hoje em dia, no sistema como está, seria prerrogativa do SUAS – Sistema Único de Assistência Social – que na prática não existe. A equipe de saúde muitas vezes cuida até mesmo de transporte, alimentação e moradia de seus pacientes. Há casos em Centros de Assistência Psico-Social, os CAPS, em que a equipe administra até o dinheiro daqueles que não têm condição de fazê-lo mas não conseguem um curador.

Segundo as palavras do ministro Alexandre Padilha, uma das medidas do programa Mais Médicos, os dois anos de serviço prestado no SUS ao final do curso de medicina, serviriam para formar, “médicos especializados em gente”. Porém, os quatro últimos anos do curso de medicina já são em atendimento direto ao SUS, diariamente. São cursados em hospitais, ambulatórios e centros de saúde do Sistema Público de Saúde, inclusive em pequenas cidades sem infra-estrutura. Portanto, ainda na faculdade aprende-se o que é a vida da maior parte da população brasileira, aquela que não tem condições de pagar por saúde privada. Os estudantes que têm empatia por essa situação há muito tempo pregam mais distribuição de renda e menos desigualdade social. Há sempre os que não têm empatia e se voltam contra a “gente pobre” e contra o SUS. Há todo tipo de excrescência na sociedade e na medicina não seria diferente, infelizmente.

O contato com a realidade do país, dessa gente que precisa mais, não transforma todos. É pouco provável que mais dois anos de tal prática “humanizem” esses médicos. Talvez um acompanhamento psicológico ao longo do curso fosse mais proveitoso nesse sentido. Há quem afirme que os recém-formados precisam acostumar-se com o SUS e aprender a atuar dentro do sistema. É importante, porém, frisar que ninguém deve acostumar-se à realidade precária do SUS, porque não é isso que os brasileiros almejam: medicina de pobre e medicina de rico. A exigência expressa nos cartazes das ruas de junho deve ser mantida. Eles diziam; “Queremos saúde padrão FIFA”. Muitos médicos querem trabalhar em uma unidade básica de saúde que seja bela e equipada como o Hospital Sírio Libanês. E querem que a população tenha acesso a esse tipo de sistema. Afinal, quem vai querer sistema privado de saúde se o público for excelente?

A medida, todavia, não é somente inócua, é danosa. Caso sejam instituídos os dois anos de serviço na atenção básica, as equipes de saúde terão um novo médico a cada dois anos. Em se tratando de Saúde da Família, essa medida é muito prejudicial. Ser médico de família é justamente conhecer a fundo a saúde daquela população, de modo a, mais que atuar de forma curativa, poder aplicar medidas preventivas reais — o objetivo maior da saúde pública. Quando o estudante começar a se familiarizar com a cidade e sua população, seus dois anos de serviços estarão no final e ele voltará a sua cidade para se formar e fazer residência. Será necessário criar, do zero, novo vínculo com o estudante que chegar.

Outro ponto que sempre se discute é que os médicos formados em escolas públicas devem uma contrapartida à sociedade. Mas o que se esquece é que educação também é dever do Estado, como está explícito na Constituição de 1988. Portanto, é o Estado que deve a muitos destes estudantes os anos de ensino privado pelos quais pagaram, e deve a todos os outros que não tiveram acesso ao ensino superior público a culpa pela falta de igualdade de condições na luta pelas poucas vagas em universidade públicas. Se todos tivessem acesso a boas escolas públicas, do ensino básico ao superior, essa discussão sequer seria necessária. Um estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), divulgado em junho deste ano, indica que o investimento em educação no Brasil aumentou de 3,5% para 5,6% do Produto Interno Bruto (PIB) entre 2000 e 2010, alcançando assim a média de investimento dos países da organização, que é de 5,4%. Porém, a forma como têm sido feitos estes gastos mantém a desigualdade no acesso ao ensino. Em 2010, a educação superior recebeu a maior parcela de gastos no Brasil ─ US$ 13.137 por estudante, mais que a média dos países da OCDE, enquanto os investimentos brasileiros em educação primária e secundária foram muito inferiores aos dos países ricos ─ US$ 2.653 por estudante, comparado com US$ 8.412 nos países da OCDE e US$ 11.859 nos EUA. Fica claro que o governo investe mais em educação superior pública, que atende principalmente aos mais abastados, em detrimento do ensino básico. Se a responsabilidade na divisão dos gastos é somente do governo, não faz sentido exigir contra-partida dos egressos das escolas públicas.

Não obstante o mérito inegável de haver médicos estrangeiros ou estudantes supervisionados, onde antes não havia médico algum, o governo considera essa medida a única resposta possível para uma suposta crise da saúde. Não há, porém, crise alguma, uma vez que os indicadores de saúde melhoraram nos últimos anos. O que há é um problema crônico, consequência de anos de subfinanciamento e má-distribuição de gastos. A falta de médicos também já poderia ter sido sanada de forma mais democrática, sem necessidade de obrigatoriedade de serviço para estudantes ou importação de médicos cuja qualidade não será comprovada por meio de exame. Em 2009, as entidades de classe fizeram uma proposta que ainda está em tramitação no Congresso. A categoria sugeriu a instituição da carreira de Estado para médicos, por meio da PEC 454/09. Caso houvesse sido aprovada na ocasião, a falta de médicos sequer estaria em discussão, pois não seria mais realidade no Brasil. Se o governo visasse uma medida mais definitiva, optaria por este meio, ao invés de Medida Provisória enviada às pressas para o Congresso.

Caso o SUS fosse financiado com 10% da arrecadação do Estado, como pedem os médicos, e não se transferisse tanto dinheiro para o sistema privado, tal medida seria perfeitamente possível. Com isto, esse médico e essa equipe de saúde com carreira de Estado lutariam por melhores condições onde trabalham, pois teriam mais vínculo em seu local de atuação. Essa seria a melhor medida que o governo poderia tomar: valorizar o médico, colocá-lo ao lado dos setores financeiramente empobrecidos, para que lutassem juntos por uma saúde de qualidade. Ninguém ganha em uma briga que opõe aqueles que atuam diretamente no atendimento à saúde da população e os que formulam as políticas de saúde pública.

*Lilian Terra é médica formada pela Universidade Federal de Minas Gerais. Atua na atenção básica do SUS de Campinas- SP, onde faz parte de uma equipe de saúde da família (PSF). É apaixonada pelo projeto do SUS e pela saúde pública e espera que um dia o sistema de saúde brasileiro seja de fato universal e não haja necessidade de se recorrer a Planos de Saúde ou serviços privados.

O Despertar da Felicidade

Estou maravilhado com os últimos anos de minha vida. Alguns muitos sonhos se realizaram, e essa máquina sonhadora permanece ainda a funcionar, gerando muitos outros.

Vejo minha vida, meu ser como uma estátua sendo lapidada pelo vento, pela maré, pelo sol, pela chuva, por outras e por si mesma. Mas não uma simples estátua, tal qual descreveu Michelangelo: "Bem vindo seja o sono, mais bem vindo o sono de pedra. Enquanto o crime e a vergonha permanecem em terra; Minha grande sorte, não ver ou ouvir; Não me acordem - por piedade, falem baixo." Sei que há muitos humanos - quiçá a maioria ou quase todos (ou seria isso um pré-julgamento estereotipado/preconceituoso?) - que são reais estátuas, em sono profundo. Ainda tenho dúvidas se nascemos realmente acordados ou se o estado de latência - mesmo aos berros do nascimento e tantos outros ao longo da vida - só é rompido pouco ou muito depois - ou nunca, a depender de quem se trate. O fato é que sou como uma estátua, em constante aperfeiçoamento, mas não dessas em sono profundo: uma estátua viva, no despertar.

Como disse Michelangelo, o sono de pedra garante não ver nem ouvir o crime e a vergonha. E é incrível como muitos passam a vida toda em sono de pedra, ignoram as mazelas sociais que a humanidade persiste ao longo de séculos e milênios. O despertar não é, inicialmente, agradável. Vai além da dor por compaixão ou do sentimento de pena: por isso, volta  e meia, todos passam - um exemplo que tenho claro para mim é o da alimentação vegetariana, pois não são poucos os "nossa, eu gostaria muito de ser vegetariano, fico super comovido ao ver como são os abatedouros, o sofrimento dos animais, mas simplesmente não consigo viver sem carne" que eu ouvi nesses cinco anos de vegetarianismo. Conheço muitas pessoas que também não conseguem viver sem o dinheiro, ou sem enganar as outras, ou sem enganar a si mesmas. Nos afundamos em vícios e isso denota a pior qualidade de uma estátua: sua inércia. Logo, esse protótipo de compaixão que leva à pena - inclusive por si mesmo - em nada caracteriza o despertar: este é muito mais que isso.

O início do despertar não é agradável porque ele torna clara a necessidade de mudança - e, com ela, os desafios e dores pelos quais terá de se passar. Mas não uma mudança qualquer: uma transformação de si. É como disse Tolstói em uma citação que eu gosto de repetir: "Todos pensam em mudar o mundo, mas ninguém pensa em mudar a si mesmo." Muitas pessoas dizem não compactuar com a miséria e a fome do mundo, mas ignoram que seu estilo de vida alimenta essa situação: seja pela forma como adquire ou aplica seu capital, ou seja por muitas outras, como a alimentação que supracitei (para quem não sabe, o que se ingere de carne poderia alimentar milhares de pessoas se se investisse o mesmo de recursos para consumir vegetais). O sentimento inicial do despertar, portanto, é de desespero, inquietude, muitas vezes tristeza também - impotência quase sempre. Todavia isso é passageiro.

Tendo tomado consciência do que o cerca e de que uma mudança é necessária para se adaptar, os sonhos nascem e se fortalecem. E isso que difere uma estátua de pedra de uma estátua humana que se lapida: ela pode sonhar não só de olhos fechados, em sono profundo, mas também - e sobretudo - de olhos abertos e desperta, agindo fortemente em sua própria lapidação e ajudando as demais nas suas. Os sonhos delineiam as atitudes, o caminho. E o maravilhoso é que, pela própria inércia - talvez a mesma que deixa outras pessoas em sono de pedra infinito -, esses sonhos e realizações alimentam outros, então eles não atingem um fim por si só, mas constituem um caminho - talvez infinito - de aperfeiçoamento.

É um despertar contínuo, pois o primeiro passo depois de abandonar os grilhões da caverna é abrir os olhos. Porém são olhos ainda acostumados à escuridão da caverna e que doem ao ver e muitas vezes veem pouco. O tempo e a vontade de continuar o despertar é que definem a clareza do que se vê e o que se faz necessário para continuar e ver ainda mais, e fazer ainda mais. Ainda vendo com clareza, há um mundo todo para explorar. E depois do mundo há o universo - que dizem ser infinito.

Há uma série de desenho animado japonês chamada Ergo Proxy que trata exatamente disso e a qual me trouxe algumas das reflexões citadas nesta crônica. Ela trata de um mundo pós-apocalíptico, em que a humanidade abandonou a Terra porque não havia mais condições de existência e deixou alguns seres sobrenaturais que seriam responsáveis de cuidar de células de sociedade pelo mundo, em enormes redomas onde a vida era viável e garantida por meio de clones. A trama traz em si várias questões e metáforas filosóficas - e deixa isso claro logo em seu episódio primeiro, ao apresentar em seus personagens vários nomes de pensadores da Humanidade, tais quais Deleuze e Lacan. E é justamente sobre sair da redoma, conhecer o mundo que a cerca, desvendar as relações sociais e ocultas que construíram essas sociedades, descobrir quem são os Proxys - os seres sobrenaturais supracitados - e qual o sentido disso tudo.

Vi no filme A Profecia Celestina - baseado em livro homônimo -, logo em seu início, um professor de História, em uma sala de aula, com uma arte mostrando a longitudinalidade da evolução humana, desde o Big Bang, perpassando os dinossauros e chegando até os humanos, por fim, no modus vivendi atual em sociedade, cidades, etc. e que perguntava, ao final da ilustração "What's next?". O filme, tal qual o livro, ensina por meio de um insight da Profecia Celestina, que a vida mostra qual é o próximo caminho, que conduzirá à felicidade e realização. Ele fala de coincidências - que não são apenas acaso - as quais conduzem as pessoas. Mas, ao meu ver, além dessas coincidências - não nego que existam, embora eu não me preocupe com sua origem -, há os sonhos - eles definem o caminho do despertar. Então, o próximo passo é definido pelos sonhos que se alimentam naqueles que veem e que, coletivamente, conduzem à uma revolução social abrangente. Há sonhos coletivos também.

Meus sonhos têm me guinado no sentido de aprimorar as formas de relações interpessoais. Não escondo de ninguém que eu desejo a sociedade socialista - sempre friso: não aquela de Marx. E cada vez mais me aproximo de pensadores como Fourier e Owen, alimentando a convicção de que a sociedade não se muda pela economia tão somente - quiçá sejam causa e consequência uma da outra. Ela deve se transformar, sobretudo por si, por dentro de suas entranhas, pelas formas como as relações se estabelecem entre as pessoas. Por isso, não basta ter pena dos miseráveis que passam fome e morrem na África (ou mesmo no Brasil, por mais que muitos neguem isso): é preciso ter amor, como ensinou Jesus; é preciso se sentir um dos culpados disso; é preciso sonhar a mudança; e é preciso agir por ela. E eu ajo pelo socialismo, principalmente aquele que muda a sociedade por meio de suas relações internas, sutis, cotidianas. Esse tem sido o caminho que venho construindo com meus sonhos e o qual tem moldado meu ser, aperfeiçoando cada vez mais essa estátua que não é de pedra bruta.

E é por isso que estou maravilhado com os últimos anos de minha vida: eu estou permeando-a cada vez mais de sonhos e realizações. E cada vez desejo sonhar mais. Cada vez me preocupo menos com "ter", para "ser" e fazer" como modos de "servir": servir à minha felicidade e a tudo que me cerca também, sobretudo Àqu-le que me proporciona essa existência. E eu sinto que meus sonhos fazem parte de um plano maior, um sonho coletivo que culminará em uma nova sociedade. Meu caminho é este definido pelos meus sonhos e realizações, essa é minha história. E, apesar das dores e sofrimentos, as realizações e os sonhos do despertar são sensivelmente mais próximos daquilo que constrói a felicidade verdadeira: construir-se (aperfeiçoar-se) é construir sua própria felicidade.

Kiri (Monoral)


Kiri (Monoral)

You complete my fate
The world unwinds inside of me
You complete my fate
The halo crawls away
You repeat my fate
Rewinding all we can
You refill my place
You refill my place

Come and save me
Come and save me

You complete my fate
The heavens stroll inside of me
You repeat my fate
Revealing who we are
You refill my place
You refill my place

Come and save me
Come and save me

Believe in me
Drink the wine
Take my hand
Fill me up

Believe in me
Drink the wine
Take my hand
Let me follow


Link: http://www.vagalume.com.br/monoral/kiri-traducao.html#ixzz2ZjfI5WZD

Existe amor nas revoluções? (Katia Marko)

Por Katia Marko, editora da coluna Outro Viver
Disponível em: http://outraspalavras.net/destaques/existe-amor-nas-revolucoes/

O corpo humano é sábio. Ele dá sinais a todo momento do seu esgotamento. “É hora de parar e reavaliar”, nos diz aquela dor constante. Nossas mentes inteligentes e astutas vão levando. Até que acende o sinal vermelho e uma simples gripe nos derruba. Mas a nossa resistência é grande e já criamos muitos anticorpos para ir sobrevivendo. Também temos as crenças que nos aliviam e resignam. Superstições vão nos distraindo, enquanto o milagre não chega. Afinal, fomos criados com hábitos que passam de pai pra filho ou de mãe pra filha que grudam feito cola de sapateiro. “Sempre foi assim, não vai mudar”.

Mas, eis que um dia, algo fora do comum acontece e coloca em xeque tudo o que sempre acreditei. Pode ser um câncer, uma poderosa depressão, uma morte inesperada de uma pessoa muito querida. O mundo desaba e tudo que fiz até então é questionado. “Poxa, mas sempre fui tão boa, trabalhadora, cumpridora dos meus deveres, por que isso aconteceu comigo. O que fiz a Deus”. E o impensável, inaceitável pensamento acaba por cravar seus dentes: será que deus existe…

Me parece que o mesmo acontece com o planeta e as suas civilizações, através dos tempos. E estou pensando em milhares e milhares de anos, antes de Cristo e ainda mais do cristianismo. “A história raramente se repete, seja como tragédia, seja como farsa, mas faz lembrar”. Tendo a concordar com Tariq Ali, jornalista e escritor paquistanês, militante de esquerda presente nos importantes levantes da década de 1960. O livro “O Poder das Barricadas” é uma aula de rebeldia. E muito do que li me remete ao que estamos vivendo no Brasil e no mundo. Parece que mais uma vez chegamos ao esgotamento de um modelo, apesar dos poderes econômicos, políticos, religiosos e midiáticos usarem de todas suas armas para manter tudo como está.

Os movimentos que explodiram em maio de 68 queriam “um mundo novo, sem guerra, opressão ou exploração de classes, baseado na camaradagem e no internacionalismo. A riqueza do Primeiro Mundo, se utilizada de maneira adequada, poderia ajudar a transformar o Terceiro Mundo. Além disso, se um socialismo significativo tivesse êxito no Ocidente, não seriam só a City londrina e o Estado que tremeriam, mas os burocratas de Moscou, igualmente temerosos das mudanças que vinham debaixo”, descreve Tariq Ali. Segundo ele, a esperança vinha da primavera de Praga, que foi sufocada antes que florescesse.

Os lemas da época retornam à cena, através de jovens que não chegaram à zona de conforto ou de não tão jovens que escolheram não estacionar junto à placa “Pare”. Sejamos realistas, peçamos o impossível. Barricadas do desejo. É proibido, proibir. Quanto mais faço a revolução, mais tenho vontade de fazer amor. Quanto mais faço amor, mais tenho vontade de fazer a revolução. Faça amor, não faça guerra. Estas foram algumas lutas que geraram uma década de utopias.

Apesar de não termos alcançado o socialismo real, e tempos sombrios de ditaduras e neoliberalismo terem vencido, muitos padrões foram derrubados. E a semente, por mais árido que seja o solo, sempre dá um jeito de renascer.

Mas o mundo ao avesso, tão bem explicado por Eduardo Galeano no livro “De pernas pro Ar”, nos ensina a padecer a realidade ao invés de transformá-la, a esquecer o passado ao invés de escutá-lo e a aceitar o futuro ao invés de imaginá-lo. “Na escola do mundo ao avesso, a escola do crime, são obrigatórias as aulas de impotência, amnésia e resignação. Mas está visto que não há desgraça sem graça, nem cara que não tenha sua coroa, nem desalento que não busque seu alento. Nem tampouco há escola que não encontre sua contra-escola”.

Mesmo que continue sendo martelado diariamente em nossas mentes, das formas mais veladas, que a mulher é um ser inferior e idiotizado que tem como único objetivo na vida conquistar um bom casamento, que os negros devem continuar escravos por questões de herança genética, que as crianças não têm direito de ser crianças e devem ficar atadas à frente da TV para aceitar desde cedo, como destino, a vida prisioneira. Mesmo que os pobres o sejam não por culpa da história, mas por obra da biologia, ou seja, levam no sangue o seu destino, e, pior, os cromossomos da inferioridade costumam misturar-se com as perversas sementes do crime. Mesmo que os índios sejam um povo em extinção há 500 anos. Mesmo que a publicidade mande consumir e a economia o proíba. Mesmo que a riqueza seja obra do divino e um direito dos escolhidos. Mesmo que o mundo seja perigoso e sejamos constantemente vigiados por olhos gigantes, sejam de deus ou do grande irmão. Mesmo com todos os riscos, alguns insistem em encarar o medo e romper as correntes.

Não é fácil ir contra um sistema que se utiliza tão bem dos meios de comunicação para se justificar. Dizer que dois mais dois não são quatro, quando tudo prova que são. Mas é necessário. Faz parte do processo de crescimento. Assim como, numa comparação com o micro, muitas vezes, não são sem dor as decisões que tomamos e contrariam as pessoas que amamos. Não fazer o que esperam de nós pode ser só uma reação, mas se tivermos consciência do que somos de verdade, pode tornar-se uma resposta.

Michael Lowy lembra em “O Pensamento de Che Guevara” que o sonho de todos os revolucionários, de Rousseau a Lenin, foi modificar não só o mundo, mas também o homem. “Para eles, a revolução não era apenas uma transformação das estruturas sociais, das instituições, do regime, mas igualmente uma transformação profunda, radical e ‘assombrosa’ dos homens, da sua consciência, de seus costumes, valores e hábitos, das suas relações sociais. Uma revolução não é autêntica se não for capaz de criar esse homem novo.”

As mudanças nas questões da vida privada, do comportamento, da sexualidade e do amor também eram o desafio no trabalho de Alexandra Kolantai, única mulher da direção do partido bolchevique e a primeira mulher do mundo, em 1917, a ocupar o posto de ministro de Estado, como Comissária de Saúde do governo Soviético. Ela insistia que ao contrário da visão predominante, de que só se poderia dedicar a estas questões com a transformação econômica e política assegurada, a gestação dessa nova moral deveria ser, necessariamente, um componente do processo de luta.

O mais interessante ou doloroso ao rever estes escritos é verificar o quanto poderíamos ter avançado enquanto civilização, não fossem as “forças ocultas”. No ensaio “A nova mulher”, de 1918, Kolantai assim defendia a mulher moderna: a autodisciplina, em vez de um sentimentalismo exagerado, a apreciação da liberdade e da independência, em vez da submissão e de falta de personalidade, a afirmação de sua individualidade e não os estúpidos esforços para se identificar com o homem amado, a afirmação do direito a gozar dos prazeres terrenos e não a máscara hipócrita da pureza, e, finalmente, o relegar das aventuras do amor a um lugar secundário na vida. “Diante de nós temos, não uma fêmea, nem uma sombra do homem, mas, sim, uma mulher-individualidade”.

Ao mesmo tempo que Kolantai afirmava que o objetivo último da mulher não deveria ser o casamento, mas a causa, também defendia que a época caracterizava-se pela ausência da arte de amar. “Os homens desconhecem em absoluto a arte de saber conservar relações amorosas, claras, luminosas, leves. Não sabem todo o valor que encerra a amizade amorosa. O amor para os homens da nossa época é uma tragédia que destroça a alma. É preciso tirar a humanidade desse atoleiro: ensinar aos homens a viver horas cheias de beleza, claras, sem grandes cuidados. Amar sempre, amar profundamente, em todos os momentos da nossa vida, amar sempre e cada vez com maior abnegação, é o destino ardente de todo grande coração”.

O amor em si é uma grande força criadora. Acredito que com criatividade, coragem, ousadia e desprendimento vamos cavando os buracos neste gigante chamado “sistema”. Os movimentos revolucionários aceleram a processo. Jovens estão batendo em nossa cara e nos obrigando a puxarmos os fios da memória. É nosso dever não ceder ao canto da sereia. As ocupações de espaços públicos, universidades resgatam o conceito de comunas, vida em comum, coletividade. Visões de mundo sufocadas pela ideologia neoliberal. Na minha modesta opinião, estamos tendo mais uma vez a chance de resgatar o ser humano.

Mas, como dizia o polêmico mestre indiano Osho, o estranho incomoda e irrita a humanidade cega. “A humanidade não é capaz de aceitar o estranho. Ela não é vasta o bastante para absorver o novo, o desconhecido, aquilo que ainda não foi experienciado. Ela se torna irritada, ela se incomoda. Ela quer destruir os seus olhos porque ela é cega e seus olhos fazem-na lembrar de sua cegueira”.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Marina Silva e o “Rede Sustentabilidade”: um projeto supranacional (Leonildo Trombela Junior)

Nota do Blog: claramente sou apoiador da Marina Silva e da Rede Sustentabilidade. Este texto é uma crítica à Marina e eu o publico com tranquilidade, pois de todas as críticas que li até agora, esta é uma das únicas que possui algum fundamento. Serve grandiosamente para reflexão, sobretudo político-ideológica.

Disponível em: http://www.midiasemmascara.org/artigos/globalismo/14268-marina-silva-e-o-rede-sustentabilidade-um-projeto-supranacional.html

Ela foi cabocla no seringal do estado do Acre e hoje é a queridinha dos globalistas (aqueles cuja crença é de que a Velha Ordem que preza pela soberania das nações é um modelo ultrapassado que deve ser substituído por um governo global supranacional). Ela é membro do Inter-american Dialogue, think-thank que conta com um grupo de ex-presidentes das três Américas, além de banqueiros, empresários e outros integrantes da nata social e financeira deste continente. Também faz parte da lista dos Defensores das Metas do Milênio da ONU (Organização das Nações Unidas) – lista essa que também inclui o bilionário empresário Ted Turner, o famoso fundador da CNN. Recebeu também o prêmio “Champions of the Earth” da ONU – um dos maiores prêmios da área. É chamada de “lendária ativista ambiental” pelos ativistas da iniciativa Carta da Terra (1) e por aí vai…

A apresentação de uma fração do currículo internacional de Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima é para que não nos enganemos. Embora tenha a saúde frágil por conta de uma contaminação por mercúrio na juventude, essa senhora evangélica de 55 anos e aparência frágil possui uma vasta influência entre bilionários e ecologistas mundo afora. Em 2010 emplacou uma candidatura à Presidência da República concorrendo pelo Partido Verde com seu vice sendo o empresário bilionário Guilherme Leal. Obteve quase 20 milhões de votos.

Marina é sem dúvida benquista por vários grupos ambientalistas e globalistas. Para Luis Dufaur, autor de publicações no exterior e do blog “Verde: a cor nova do comunismo” – que denuncia os estratagemas dos movimentos ambientalistas e globalistas -, as origens amazônicas de Marina, sua militância no Partido Revolucionário Comunista (PRC – ala radical que estava sob a égide petista no Acre) e sua luta junto de Chico Mendes e das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) são “atributos” que fazem dela o perfil ideal para ser a imagem “popular” que os ambientalistas e globalistas pretendem projetar.

“Ela encarna bem o figurino imaginado pela Teologia da Libertação que segue a linha de Frei Beto e Dom Casaldáliga, portanto comuno-tribalista e ambientalista. Quer dizer, uma mulher do povo que sofreu pobreza e doenças tropicais, e sai da floresta para contestar a ordem social brasileira acusada de ‘capitalista’ e ‘exploradora’. Esta imagem a meu ver inclui muitos exageros propagandísticos imaginados por marqueteiros”, diz Dufaur.

Aproveitando-se dessa grande influência e poder que lhe foi concedido, Marina Silva já aplaina o terreno para a candidatura em 2014. Com seu novo partido, o “REDE Sustentabilidade”, ela quer, segundo palavras próprias, nada menos que “mudar a cultura política do país”. Marina diz que seu partido não é de esquerda e nem de direita, mas é “à frente”. Além do apoio de Leal, Marina também conta com Maria Alice Setúbal, uma das herdeiras do Itaú.

Mas será que Marina realmente vem com uma proposta diferente? Segundo o economista e mestre em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/SP), Nivaldo Cordeiro, “Estamos diante de uma ação típica das esquerdas recomendadas por Lênin. [...] a famosa estratégia das tesouras”.

Essa estratégia das tesouras é uma forma de se referir à metodologia dialética marxista-leninista, cuja metáfora da tesoura fala das duas lâminas que são opostas (como neste caso, a aparente oposição de Marina Silva ao atual establishment político), mas que no final das contas fazem parte do mesmo corpo; e sendo do mesmo corpo, quando essas duas lâminas convergirem — isso acontece fatalmente na política —, deceparão aqueles que estiverem no caminho delas. O termo foi muito usado para se referir à aparente oposição que existe há muito entre os governos russo e chinês (desde os tempos comunistas até hoje).

O filósofo Olavo de Carvalho no artigo “A mão de Stálin está sobre nós” diz que, através da estratégia das tesouras, “a oposição tradicional de direita e esquerda é então substituída pela divisão interna da esquerda, de modo que a completa homogeneização socialista da opinião pública é obtida sem nenhuma ruptura aparente da normalidade. A discussão da esquerda com a própria esquerda, sendo a única que resta, torna-se um simulacro verossímil da competição democrática e é exibida como prova de que tudo está na mais perfeita ordem.” (isso já acontece no Brasil, onde partidos como PT, PSDB, PSB e o futuro partido da Marina dominam completamente as ações políticas, deixando espaço apenas para divergências dentro da própria esquerda ou para partidos governistas como o PMDB).

Outro bom exemplo dessa estratégia das tesouras leninista são as denúncias feitas pelos partidos de extrema esquerda, como se pode ver no site do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU), que por meio de uma extensa matéria mostra alguns dos “esqueletos” que Marina tem no armário (ver matéria no link: pstu.org.br/conteudo/rede-de-marina-silva). O site do Partido Comunista do Brasil (PC do B) também não se esquiva de reproduzir ou redigir textos com fortes críticas ao projeto de Marina Silva, como se pode ver nos links: vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=206125&id_secao=1 e vermelho.org.br/editorial.php?id_editorial=1170&id_secao=16.

Apesar das ferrenhas críticas recebidas pela “esquerda da esquerda”, sempre quando indagada sobre os presidentes Lula ou Dilma, aliados do mesmo PC do B, Marina prefere adotar um tom amistoso, demonstrando discordâncias apenas em pontos específicos, como é o caso da política ambiental. Segundo Nivaldo Cordeiro, “a turma da Marina Silva sempre foi PT de coração”. A longa lista de serviços que Marina prestou ao PT desde quando era uma jovem militante no PRC até chegar ao Ministério do Meio Ambiente – cargo que ocupou desde a posse de Lula, em 2003, até 2008 – é algo que ela faz questão de lembrar sempre em suas entrevistas.

Desenvolvimento sustentável e religião

O termo “desenvolvimento sustentável” surgiu pela primeira vez nas discussões da ONU na década de 1980. Ele foi cunhado para condensar um ideal que já havia sido exposto desde a Conferência de Estocolmo em 1972. Junta – a seu modo – as idéias de desenvolvimento econômico e político com a preservação da natureza, com a justificativa de que devemos deixar um “mundo melhor” para as gerações futuras. Deste modo, esse ideal acaba por atuar nas frentes econômica, política, ecológica e cultural. As partes ética e religiosa restantes são cobertas pela anteriormente citada Carta da Terra, que segundo um de seus maiores promotores, Mikhail Gorbachev, aspira a ser nada menos que uma nova versão dos Dez Mandamentos (2).

A culminação do que entendemos por “desenvolvimento sustentável” foi o documento “Agenda 21”, apresentado na Conferência Eco-92, no Rio de Janeiro. Esse documento contém 21 diretrizes elaboradas pela ONU para servirem de “instrumento de planejamento para a construção de sociedades sustentáveis” (ver neste link: http://sustainabledevelopment.un.org/).

A idéia de desenvolvimento sustentável é, basicamente, aplicar leis supranacionais cujo conteúdo é aquilo que a ONU acha que é melhor para o mundo, independentemente do que as populações locais venham a achar. Aqui no Brasil, muito desses ideais supranacionais da “Agenda 21” (que, por conseguinte, são óbvias afrontas à soberania de um país) foram bem encaminhados na gestão de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente.

Mesmo quando não são diretamente aplicadas, essas medidas supranacionais acabam por ter grande influência na legislação, como foi o caso do Código Florestal aprovado em 2012, que levou em conta várias “propostas utópicas e quiméricas da ONU”, nas palavras de Luis Dufaur. Segundo Dufaur, esses documentos “sinalizam os rumos das transformações legais presentes e futuras que o PT e seus amigos ambientalistas promovem no país”.


Notas:
(1) A Carta da Terra é uma declaração de princípios éticos fundamentais cujo intuito é “construir uma sociedade global justa e sustentável para o século XXI”; para isso basta que se dê poder ilimitado a eles.  Tem o endosso de gente do quilate do ex-presidente soviético Mikhail Gorbachev e da ex-Rainha e atual Princesa Beatrix da Holanda.

(2) v. Lee Penn. False Dawn: The United Religions Initiative, globalism, and the quest for a one-world religion. p.16



Publicado no site da revista Vila Nova.

Leonildo Trombela Júnior é jornalista e tradutor.

Causas e Causos (Marina Silva)

Marina Silva | Folha.com |BR 19/07/2013

Causas e causos
Gosto de conversar com pensadores do Brasil e do mundo contemporâneo, como na roda de conversa desta semana, promovida pelo Instituto Democracia e Sustentabilidade, ou no contato com o filósofo Renato Janine Ribeiro, que ele relatou esses dias. Alguém pode supor um mero objetivo eleitoral. É muito mais: o diálogo sempre será tão essencial quanto o ar e o alimento.
Ora, direis, ouvir filósofos, por certo não queres capitalizar o clamor das ruas, os resultados das pesquisas, as possibilidades do marketing. Mas insisto na ideia de que a política não deve ser reduzida ao cálculo de perdas e ganhos.
Senão, vejamos. Na pressa de escapar à rejeição das ruas, o governo anunciou pactos, constituinte e plebiscito, em nervosa gesticulação que o Congresso já tratou de acalmar. Tudo resulta numa minirreforma feita para garantir o monopólio dos partidos, a manutenção de antigos esquemas e um "centrão" dominante há décadas, seja qual for o governo.
O que sobra em pragmatismo, falta em compreensão das causas profundas, da necessidade de democratizar a democracia com a participação direta e os aplicativos das novas tecnologias. Despreza-se boas propostas, como as listas independentes, por falta de reflexão sobre o sentido da ação política na civilização em crise.
Tivessem ouvido os pensadores, suportariam o rumor das ruas sem a ansiedade de abafar um possível grito das urnas. Que ouvissem, então, o povo, que é filosófico por natureza e tem sabedoria no humor. A minirreforma me lembra um saboroso causo nordestino que meu pai costumava contar.
Havia um pregador que disfarçava seu despreparo teológico com o que chamaremos de exageros para evitar a palavra mentira, que o povo do vilarejo usava para justificar seu afastamento da congregação. Vendo a perda de fiéis, o pregador achou um meio de se controlar: amarrou-se num barbante que um auxiliar, oculto, puxaria quando ele se excedesse.
Assim preparado, foi pregar na Sexta-Feira Santa e narrou o episódio da prisão de Jesus, em que Pedro corta a orelha do soldado romano. Disse que o apóstolo usou uma espada de doze metros. Sentindo a sacudida do ajudante, reduziu: digamos, irmãos, que a espada tivesse seis metros. E eis que longe da vista de todos, o ajudante é atacado por um credor, exigindo a quitação de uma dívida. Discutem e trocam socos. Quando consegue livrar-se, o ajudante vê que mantivera o barbante na mão durante a refrega. Corre para o salão, onde o pregador, ajoelhado, jurava pelos cravos da Paixão que a tal espada não passava de um canivetezinho.
Se os chefes da República ouvissem a sabedoria popular, fariam uma reforma do tamanho do Brasil. Ou, pelo menos, entregariam o barbante de seu comando político a auxiliares menos endividados.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Saúde: Orçamento e Financiamento (João Sicsu)

Disponível em: http://outraspalavras.net/outrasmidias/uncategorized/saude-orcamento-financiamento/

A justiça social, ou seja, a redução de desigualdades, também deve ser promovida por intermédio do gasto do orçamento público. Além disso, o gasto público pode ser utilizado para promover a melhoria da qualidade de vida ao gerar crescimento e estabilidade macroeconômica. Os objetivos da justiça social, do crescimento e da estabilidade não são contraditórios.

O gasto público pode promover justiça social e melhoria da qualidade de vida da população quando é distributivo de renda, de bens e de serviços para aqueles que não teriam condições de adquiri-los quando disponíveis em mercados comandados pela lei da oferta e da procura. Esperar que a justiça social seja encontrada em competição no livre jogo de mercado é equivalente a esperar pelo “dia de são nunca”.

Pode-se, então, analisar os gastos públicos federais no Brasil sob a ótica distributivista e de justiça social descritas. Objetiva-se analisar, mais especificamente, as possibilidades de financiamento e o gasto com a saúde pública. Em 2010, o Governo Federal gastou apenas R$ 54,5 bilhões nessa rubrica. Gastou, no mesmo ano, em educação, R$ 40,2 bi e com o pagamento de juros referentes ao serviço da dívida pública, R$ 195 bi. Em 2008, último ano em que os dados sobre municípios e estados estão disponíveis, o gasto total das três esferas de governo em saúde, foi de R$ 109 bilhões.

O gasto total com saúde no Brasil é, portanto, inferior a 4% do seu PIB. Países que possuem um sistema de saúde gratuito semelhante ao SUS brasileiro gastam pelo menos 6% do PIB. Tais países, como o Reino Unido e a Alemanha, ademais, possuem uma população menor que a do Brasil. Maior orçamento público da saúde em relação ao PIB, economias maiores e populações menores são fatores que explicam a qualidade desses sistemas de saúde.

A economia tem crescido nos últimos anos, a população brasileira está aumentando a taxas mais reduzidas, mas o orçamento público para a saúde é limitado. Portanto, o desafio é aumentar o gasto com a saúde pública.

A pergunta é: quantos bilhões de reais devemos acrescentar ao orçamento público da saúde? Um amigo sugeriu uma “conta de padaria”: um plano de saúde privado voltado para a classe média C cobra mensalidade de R$ 90 (e promete um “paraíso” aos seus potenciais clientes), multiplique-se este valor pela população (194 milhões de habitantes), multiplique-se por 12, e encontra-se o gasto total anual necessário mínimo – (mínimo porque a população sabe que promessas de planos de saúde privados não são críveis). Feita a “conta de padaria”, chega-se ao valor aproximado de R$ 90 bilhões adicionais.

Não é possível transferir esse montante das demais rubricas do orçamento para a saúde. Somente uma delas é passível e necessária de ser reduzida: serviço da dívida pública mobiliária federal (ou seja, o pagamento de juros por parte do governo federal). Mas, outras fontes de financiamento para a saúde devem ser acionadas: a carga tributária sobre os pobres e a classe média é alta quando comparada com a carga da altíssima classe média, dos ricos e das grandes corporações financeiras e não-financeiras.

Portanto, o óbvio pode ser feito: reduzir a remuneração dos títulos da dívida pública e tributar, elevar alíquotas e estabelecer novas contribuições para os segmentos que têm feito pouco sacrifício contributivo.

Seguem abaixo algumas sugestões, que poderiam ser combinadas e utilizadas em conjunto:

(a) aumentar a alíquota de Contribuição Sobre o Lucro Líquido (CSLL) paga por instituições financeiras; em 2008, o Governo aumentou esta alíquota de 9 para 15%; quando o governo fez a majoração através de uma Medida Provisória, o DEM (partido político) apresentou ao STF uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI); o governo para rebater a ADI informou ao STF que “… não pode haver dúvidas de que, se há um setor econômico, no Brasil, que caberia ser o destinatário de alíquota majorada da CSLL (…), este setor é o setor financeiro, que, a cada ano, bate novos recordes, a nível mundial em relação a esse setor econômico, em matéria de lucros”; mais ainda, em 2007, o senador tucano Álvaro Dias apresentou projeto de lei para estabelecer alíquota de 18% para a CSLL paga pelos bancos e demais instituições financeiras;

(b) tributar lucros remetidos ao exterior por parte de multinacionais (bancos e empresas), que pela legislação em vigor são isentos de imposto de renda; o valor dos recursos remetidos às matrizes nos doze meses compreendidos entre agosto de 2010 e julho de 2011 alcançou US$ 34,19 bilhões; no mês de agosto, o setor financeiro multinacional remeteu quase US$ 1 bilhão ao exterior; a remessa total nesse mês foi superior a US$ 5 bilhões;

(c) tributar a propriedade de jatinhos, helicópteros, iates e lanchas, que pela legislação atual não pagam imposto; diferentemente da propriedade de carros populares, que pagam IPVA;

(d) apurar as formas de fiscalização do pagamento do imposto territorial rural (ITR), que contribuiu somente com 0,07% do total arrecadado pela União em 2010, ou seja, apenas R$ 526 milhões; uma forma de aumentar a arrecadação desse imposto seria estabelecer em lei que o valor declarado da terra pelo proprietário para efeito de pagamento do ITR deveria ser utilizado pela União em processos de desapropriação;

(e) Criar um IGMF, imposto sobre as grandes movimentações financeiras, que tributaria aqueles (pessoa física ou jurídica) que movimentassem mensalmente valores superiores a R$ 2 milhões.

Por último, é importante reconhecer que a gestão do orçamento da saúde deve ser aprimorada para que sejam evitados desperdícios e desvios de recursos. Entretanto, também é importante reconhecer que os recursos atuais são nitidamente insuficientes. O caminho ideal seria iniciar, de forma simultânea, um processo de auditoria, melhoria de gestão e ampliação das fontes de financiamento para a saúde pública no Brasil.

João Sicsu é Professor-Doutor do Instituto de Economia do Rio de Janeiro

domingo, 14 de julho de 2013

sábado, 13 de julho de 2013

Direita ou Esquerda? À Frente!

Os da direita me rotulam de esquerda. Os da esquerda me rotulam de direita.

Eu até que podia estar em crise existencial, contudo, por sorte, tenho a compreensão de que nem eles sabem o que de fato são. Tampouco seus líderes partidários, que movem-se por fisiologismo partidário, pragmatismo político e por uma política de casuísmos.

Meu desejo sempre foi e será o socialismo (não o marxista), pois é nele que alcançaremos a justiça social e a felicidade que todos merecemos. O capitalismo é um sistema que gera dor, sofrimento e infelicidade para quem produz - e priva muitos de um direito básico, o próprio trabalho digno.

No entanto, a jornada pela mudança de paradigma sócio-econômico é precedida por uma jornada de mudanças quiçá ainda maior: a do paradigma político-social. E essa é minha causa maior neste momento. Uma nova forma de fazer política, uma nova forma de nos relacionarmos, isso é fundamental para construir a sociedade socialista pura e verdadeiramente - e não como aquelas que se basearam no socialismo marxista e em suas vertentes.

Não há pressa. Não devemos ter pressa. Uma mudança profunda e radical exige paciência, persistência e sobretudo sonhos - e paixão por eles. Ao invés de fragmentarmos nosso esforço coletivo por uma sociedade mais justa e igualitária, unamo-nos.

E, aos poucos, seguindo as pistas da Nova Política, fundamentaremos uma nova forma de sociedade, na qual o socialismo será inevitável.

Essa é a minha jornada, à frente da direita e da esquerda tradicionais.

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Confusões conceptuais no governo do PT, por Leonardo Boff

Confusões conceptuais no governo do PT, por Leonardo Boff
(Disponível em http://www.brasildefato.com.br/node/13540)

Estimo que parte das razões que levaram multidões às ruas no mês de junho tem sua origem nos equívocos conceptuais presentes nas políticas públicas do governo do PT. Não conseguindo se desvencilhar das amarras do sistema neoliberal imperante no mundo e internalizado, sob pressão, em nosso país, os governos do PT tiveram que conceder imensos benefícios aos rentistas nacionais para sustentar a política econômica e ainda realizar alguma distribuição de renda, via políticas sociais, aos milhões de filhos  da pobreza.

O Atlas da exclusão social – os ricos no Brasil (Cortez, 2004) embora seja de alguns anos atrás, mantém sua validade, como o mostrou o pesquisador Marcio Pochmann (O pais dos desiguais, Le Monde Diplomatique, outubro 2007). Passando por todos os ciclos econômicos, o nível de concentração de riqueza, até a financeirização atual, se manteve praticamente inalterado. São 5 mil famílias extensas que detêm 45% da renda e da riqueza nacionais. São elas, via  bancos, que emprestam ao governo; segundo os dados de 2013, recebem anualmente do Governo 110 bilhões de reais em juros. Para os projetos sociais (bolsa família e outros)  são destinados apenas  cerca de 50 bilhões. São os restos para os considerados o resto.

Em razão desta perversa distribuição de renda, comparecemos como um dos países mais desiguais do mundo. Vale dizer, como um dos mais injustos, o que torna nossa democracia extremamente frágil e quase farsesca. O que sustenta a democracia é a igualdade, a equidade e a desmontagem dos privilégios.

No Brasil se fez até agora apenas distribuição desigual de renda, mesmo nos governos do PT. Quer dizer, não se mexeu na estrutura da concentração da renda. O que precisamos, urgentemente, se quisermos mudar a face social do Brasil, é introduzir uma redistribuição que implica mexer nos mecanismos de apropriação de renda. Concretamente significa: tirar de quem  tem demais e repassar para quem tem de menos. Ora, isso nunca foi feito. Os detentores do ter, do poder, do saber e da comunicação social conseguiram sempre impedir esta revolução básica, sem a qual manteremos indefinidamente  vastas porções da população à margem das conquistas modernas. O sistema político acaba servindo a  seus interesses. Por isso, em seu tempo, repetia com frequência Darcy Ribeiro que nós temos uma das elites mais opulentas, antissociais e conservadoras do mundo.

Os grandes projetos governamentais destinam porções significativas do orçamento para os projetos que as beneficiam e as enriquecem ainda mais: estradas, hidrelétricas, portos, aeroportos, incentivos fiscais, empréstimos com juros irrisórios do BNDES. A isso se chama crescimento econômico, medido pelo PIB que deve se equacionar com a inflação, com as taxas de juros e o câmbio. Privilegia-se o agronegócio exportador que traz dólares à agroecologia, à economia familiar e solidária que produzem 60% daquilo que comemos.      

O que as multidões da rua estão reclamando é: desenvolvimento em primeiro lugar e a seu serviço o crescimento  (PIB). Crescimento é material. Desenvolvimento é humano. Significa mais educação, mais hospitais de qualidade, mais saneamento básico, melhor transporte coletivo, mais segurança, mais acesso à cultura e ao lazer. Em outras palavras: mais condições de viver minimamente feliz, como humanos e cidadãos e não como meros consumidores passivos de bens postos no mercado.  Em vez de grandes estádios cujas entradas aos jogos são em grande parte proibitivas para o povo, mais hospitais, mais escolas, mais centros técnicos, mais cultura, mais inserção no mundo digital da comunicação.

O crescimento deve ser orientado para o desenvolvimento  humano e social. Se não se alinhar a esta lógica, o governo se vê condenado a ser mais o gestor dos negócios do que  o  cuidador da vida de seu povo, das condições de sua alegria de viver e de sua admirada criatividade cultural.

As ruas estão gritando por um Brasil de gente e não de negócios e de negociatas; por uma sociedade menos malvada devido às desigualdades gritantes; por relações sociais transparentes e menos escusas que escondem a praga da corrupção; por uma democracia onde o povo é chamado a discutir e a decidir junto com seus representantes o que é melhor para o país.

Os gritos são por humanidade, por dignidade, por respeito ao tempo de vida das pessoas para que não seja gasto em horas perdidas nos péssimos transportes coletivos mas liberado para o convívio  com a família ou para o lazer. Parecem dizer: “recusamos ser animais famintos que gritam por pão; somos humanos, portadores de espírito e de cordialidade que gritamos por beleza; só unindo pão com beleza viveremos em paz, sem violência, com humor e sentido lúdico e encantado da vida”. O governo precisa dar esta virada.

As diferenças: a rapaziada é #, a pelegada é $, de Josias de Souza

As diferenças: a rapaziada é #, a pelegada é $, de Josias de Souza
(Disponível em: http://josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/2013/07/11/as-diferencas-a-rapaziada-e-a-pelegada-e/)


Excluídas das passeatas de junho, as centrais sindicais e seus penduricalhos (UNE, MST, PT, PCdoB, PDT e etcétera) organizaram o seu próprio ‘Dia Nacional de Luta’. Isso foi ótimo. Ajudou a explicar por que a rapaziada refugou a ‘solidariedade’ da pelegada partidário-sindical. São muitas as diferenças entre os dois movimentos. A principal delas é a forma como os dois grupos se relacionam com os cofres públicos. Um entra com o bolso. Outro usufrui. Vai abaixo uma tentativa de distinguir o novo do antigo:



A rapaziada é #. A pelegada é $.

A rapaziada é o bolso. A pelegada é imposto sindical.

A rapaziada é coxinha. A pelegada é pastel-de-vento.

A rapaziada é sacolejo. A pelegada é tremelique.

A rapaziada é YouTube. A pelegada é videoteipe.

A rapaziada é Facebook. A pelegada é assembléia.

A rapaziada é máscara de vingador. A pelegada é cara de pau.

A rapaziada é viral. A pelegada é bactéria.

A rapaziada é chapa quente. A pelegada é chapa branca.

A rapaziada é sociedade civil. A pelegada é sociedade organizada.

A rapaziada é banco de praça. A pelegada é BNDES.

A rapaziada é a corrida. A pelegada é o taxímetro.

A rapaziada é asfalto. A pelegada é carro de som.

A rapaziada é horizonte. A pelegada é labirinto.

A rapaziada é fumaça. A pelegada é cheiro de queimado.

A rapaziada é explosão. A pelegada é flatulência.

A rapaziada é o público. A pelegada é a coisa pública.

A rapaziada é combustão espontânea. A pelegada é ignição eletrônica.

A rapaziada é luz no fim do túnel. A pelegada é beco sem saída.

A rapaziada é pressão popular. A pelegada é lobby.

A rapaziada é farinha pouca. A pelegada é meu pirão primeiro.

A rapaziada é terra em transe. A pelegada é cinema novo-velho.

A rapaziada é o desejo de futuro. A pelegada é o destino-pastelão.

A rapaziada é namoro. A pelegada é tédio conjugal.

A rapaziada é grito. A pelegada é resmungo.

A rapaziada é algaravia. A pelegada é palavra de ordem.

A rapaziada é poesia. A pelegada é pedra no caminho.

A rapaziada é dúvida. A pelegada é óbvio ululante.

A rapaziada é Fora Renan. A pelegada é o bigode do Sarney.

A rapaziada é abaixo a corrupção. A pelegada é a perspectiva de inquérito.

A rapaziada é mistério. A pelegada é indício.

A rapaziada é a alma do negócio. A pelegada é o segredo.

A rapaziada é novidade. A pelegada é o mesmo.

A rapaziada é anormalidade. A pelegada é vida normal.

A rapaziada é impessoal. A pelegada é departamento de pessoal.

A rapaziada é decifra-me. A pelegada é devoro-te.

Resgatar saúde pública é caminho para que os Brasis se encontrem, por Marcelo Semer

Resgatar saúde pública é caminho para que os Brasis se encontrem
Por Marcelo Semer

As reações aos movimentos de protestos podem nos dar uma oportunidade ímpar de fazer com que os nossos Brasis se encontrem.
Entre os manifestantes que exigem ‘hospitais públicos padrão-Fifa’ e os postos de saúde vazios interior afora, há uma distância gigantesca.
A distância de dois países que mal se comunicam e pouco se conhecem.
Quem sabe não é o momento de apresentá-los?
Porque, afinal de contas, não basta sair às ruas. É preciso reconhecer quem vive nelas.
A hora também exige cautela para que o movimento que nasceu libertário e na lógica da solidariedade não se contamine pelo egoísmo.
O exemplo fornecido pela última edição da revista Veja é um sinal de alerta: sua sugestão para excluir direito de voto a beneficiários do Bolsa-Família é uma despudorada evocação do voto censitário, que nos remete nada menos que ao Império. Como, aliás, já havia sido a campanha de memória escravocrata em reação à PEC das Domésticas.
Jogar a classe média contra a pobreza só interessa mesmo a quem fatura com a miséria.
Na área da medicina, por exemplo, a degradação da saúde pública nas últimas décadas acabou por vitaminar justamente as instituições financeiras que controlam a saúde privada.
Salvo raras exceções, os médicos vêm abandonando a profissão liberal para viver como empregados mal remunerados de companhias seguradoras. Não só por comodidade, mas também por interesses de mercado das próprias empresas, é que trabalham nas áreas onde existe clientela e, portanto, faturamento.
Os planos de saúde pouco regulados conseguiram a proeza de, excluindo desde logo a pobreza, castigar a classe média dos dois lados do estetoscópio.
Só isso já seria motivo suficiente para que houvesse um maior envolvimento de todos os interessados, médicos e pacientes, no fortalecimento da saúde pública.
O modelo da área jurídica, com dedicação integral e exclusiva e salários atraentes, possibilitou povoar o interior com serviços da Justiça. Quem sabe a proposta do governo não avance para esse caminho.
O modelo privatista, como em outras áreas, é excludente e se imanta ao dinheiro –ou seja, está sempre onde menos é necessário.
Resgatar a saúde pública como paradigma do sistema e atuar para reduzir as desigualdades regionais nem deveriam ser consideradas propostas de governo: são determinações expressas da Constituição Federal.
Fazer a população mais carente se apropriar do que é público é o sentido básico da ideia de República que, de uma forma ou de outra, acabou lembrada, ainda que inconscientemente, nas avenidas do país.
Não haverá mais educação, mais saúde, mais transporte se prevalecer a lógica do serviço como mercadoria. Os limites do mercado são estreitos demais para atender a todos.
Essa é a conclusão a que manifestantes, governos e partidos acabarão por chegar mais cedo ou mais tarde: um ataque à corrupção é também um ataque aos corporativismos e à submissão a margens incontroláveis de lucro.
Porque a República só será de todos se não for apenas de alguns.

Texto original em: http://terramagazine.terra.com.br/blogdomarcelosemer/blog/2013/07/10/resgatar-saude-publica-e-caminho-para-que-os-brasis-se-encontrem/

quinta-feira, 4 de julho de 2013

A Vida, A Humanidade, A Medicina e Eu

Pode soar banal o que irei abordar em minha crônica hoje, mas é incrível como das banalidades surgem reflexões interessantes.
Hoje sofri minha primeira reprovação importante na faculdade.
Vim no ônibus pensando no que isso representa em minha vida, depois de ter conversado com o professor do módulo sobre isso. Veio-me à mente questões importantes as quais o docente suscitou e muitas outras, coisas da minha cabeça.
Será que é a Medicina mesmo minha futura profissão?
Não sei. Se nem tenho certeza se realmente existo ou qual a natureza de minha existência, por que eu deveria saber isso? Por que eu deveria saber se fiz a escolha correta? O que sei, e disto tenho certeza, é que essa escolha tem me propiciado experiências de desafio, frustrações, conquistas. Tenho plena consciência de que, muito além da aquisição de conhecimentos e habilidades, essa formação está me construindo como sujeito, meu caráter, minha forma de relacionar-me. Tenho a impressão de que não importa a profissão em que eu esteja, a escolha que eu faça, em qualquer lugar eu vou conseguir essa construção pessoal e como isso é um dos fatores que mais pesam em minha escolha, tanto faz eu estar na Medicina ou em qualquer outro curso.
Outro fator que pesa muito é a minha participação na transformação social. Apesar de várias mágoas e desencantos com a sociedade, há algo muito forte dentro de minha mente: ser útil. E utilidade, para mim, é servir à formação de um novo modelo de sociedade, baseado em justiça social. Esse ponto me aproximou muito da Medicina quando conheci o funcionamento do SUS e o novo conceito ampliado de saúde. O controle social e a capacidade de agir na mudança da comunidade pela atenção primária é algo que me fascina, é um desejo que faz meu coração bater mais forte.
No entanto, há um significativo fator limitante: meu estilo de vida. Prezo pela minha saúde, em todos os sentidos. E eu possuo uma tendência a ter um relógio biológico um pouco diferente das outras pessoas: tendo a adormecer mais tarde e a despertar no final da manhã. E é uma tortura para mim - realmente uma tortura, acredite - acordar cedo. Em, minha faculdade, as aulas iniciam às 7h30, que vão até 11h50 e se cursar a fase completa continua das 13h30 às 17h10 - todos os dias úteis. Ainda há o tempo para o estudo sozinho, para desenvolver projetos (pesquisa, extensão) e sobra muito pouco para outras coisas que eu necessito: alimentação saudável, exercício físico, sono de qualidade. E Política.
Tenho um prazer quase que intrínseco por Política. Parece que nasci gostando. Eu amo tudo que advém das ciências sociais, me encanta entender e viver os relacionamentos interpessoais, as construções como indivíduo e sociedade. E daí surge outro fator que acarreta dúvidas quanto minha escolha profissional. Será que eu não devia ter escolhido Ciências Sociais? Psicologia? Filosofia?
Pode parecer estranho, mas o que me motivou a escolher Medicina, e não essas profissões foi a humanidade. Eis um motivo que me levou a descartar Agronomia também, outra área que me interessa. Eu preciso de uma profissão que me deixe em contato constante com humanos, gente, pessoas. Há algo em minha constituição mental que sempre me leva à frieza, objetividade, um perfil ótimo para um pesquisador tradicional ou para um empresário à moda antiga, mas que eu não valorizo. Tenho uma preocupação enorme em perder minha humanidade e dedicar-me a essas áreas sociais me conduziria a ficar preso em uma biblioteca, em meio a livros, teorias, etc., entretanto longe de pessoas. Seria uma excelente forma de eu superar minhas dificuldades, todavia seria uma fuga de minha construção como sujeito e de minha contribuição real à sociedade.
É difícil para mim contar essa história em uma conversa de bar, ou mesmo para meus amigos da faculdade. Não sei se por vergonha, ter medo de parecer um idiota, ou ser mesmo um idiota ou um esquizofrênico, enfim... em meio a banalidades, em palavras constituo minhas reflexões, sem medo do que pensará o leitor, pois nesse momento estamos apenas eu e meu instrumento de redação. O depois é o depois, pois agora sou eu e meus pensamentos, apenas.
Sim, o agora sou eu, pensando em ser ou não médico. Contudo o que é ser médico hoje? Antes da faculdade, para mim, o médico era um "mestre das doenças", e em meus estudos pude conhecer o ser médico "mestre da vida", que ajuda as pessoas a encontrarem formas de viver melhor em uma sociedade e um mundo que a todo instante a ela impõe dificuldades, em doenças que acometem ora seu corpo, mas ora também seu espírito ou mente - ou ambos. E é com a vida que eu me comprometi.
Logo antes de passar no vestibular, eu fiz um ritual próprio, pessoal e íntimo de compromisso com D-us. Eu me comprometi à trabalhar pela vida, pela sua manutenção, criação e aperfeiçoamento. E a vida é dinâmica, a vida está nas ruas, e não dentro das quatro paredes de uma biblioteca, ou de um laboratório. Está também na natureza semi-intacta (já que hoje poucos são os lugares onde o homem não imprimiu o reflexo de sua existência). E isso me remete novamente a ser médico. A Medicina concebida sob o aspecto da comunidade, relaciona-se com tudo: meio ambiente, sociedade, pessoas - e suas mentes, psicologia. E é aí que eu sinto que devo estar, no meio de "tudo", na vida.
Tratei aqui muito de fatores limitantes e fortalecedores internos até agora, mas há questões externas também. Diante de toda a dificuldade que tenho enfrentado em meu curso, imagine abrir o facebook e ver uma "enchente" de imagens e comentários do tipo "médico filho de papai", de que Medicina é vida boa, de que ser médico é ser elite, sem se preocupar com as pessoas, etc. Pode parecer ridículo, mas é desmotivador. Por que estou sofrendo tanto em servir à sociedade, agindo no sentido de possibilitar uma nova forma de relação social e de Medicina, inclusive, enquanto as pessoas menosprezam tanto minha profissão? Sei que há os maus médicos, mas há maus professores, maus engenheiros, há gente boa e ruim em todas as profissões. É desmotivador me esforçar e sofrer tanto para me formar na profissão que todo mundo vê com tanta negatividade generalizada.
O fato é que minha reprovação, realmente, está alicerçada em todos esses fatores. Enquanto tento domesticar meu sono, encontrar um equilíbrio entre o tempo para minhas atividades pessoais e profissionais, há a pressão. Pressão da família para que eu me forme logo e possa ajudar a sustentá-la. Pressão dos professores para que eu resolva logo meus problemas e me torne enfim um "bom aluno". Pressão dos colegas para que eu não seja um vagabundo, ou um perdido, como muitos me veem. Pressão dos amigos pessoais, que desejam compartilhar a vida social comigo, mas não conseguem porque estou muito dedicado à faculdade. E, não menos importante, enfim, minha pressão pessoal em atender a todos esses chamados da sociedade e, ao mesmo tempo, construir algo que defina "quem sou eu", para num futuro próximo resolver a questão de se a Medicina é a escolha correta, de fato, para mim.
Essas reflexões interessantes que surgiram da banalidade me conduzem ao que eu sempre soube, depois de me tornar estudante de Medicina: eu sei que vou sofrer, talvez mais do que já sofro, contudo eu devo persistir. Estou crescendo como nunca antes, estou cada vez mais perto de meus sonhos, de me tornar quem sempre desejei. Talvez no futuro eu venha a optar por uma outra profissão, mas por agora eu sei que estou onde devo estar e devo continuar persistindo, sofrendo se preciso, mas contentar-me felizmente em saber que estou onde devo estar. Posso não me tornar médico num futuro próximo, todavia estou me formando humano, gente. E isso me basta, mesmo que ser humano, hoje, não me garanta estar vivo - no capitalismo, o pão, a água, etc. se compra com o trabalho. No entanto, mesmo assim, me basta ser humano, ainda que um dia isso me custe a vida. Sou e continuarei sendo humano, cada vez mais. E, por agora, sou e continuarei estudante de Medicina. Que assim seja, até que a humanidade nos separe.
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