terça-feira, 29 de outubro de 2013

Mídia democrática: Argentina 4 x 0 Brasil (Pedro Ekman)

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Desde a aprovação da Lei de Meios, multiplicaram-se, no país vizinho, TVs e rádios públicas e comunitárias. Fatos e números mostram resultados concretos da garantia do Direito à Comunicação

Por Pedro Ekman*, no Intervozes

A Argentina comemorou quatro anos de vida da Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual 26.522, popularmente conhecida como lei de meios, no dia 10 de outubro. Os resultados produzidos pela lei construída para democratizar a comunicação no país saltam aos olhos, mesmo que o monopólio siga com todos os esforços para interditar a aplicação integral da regra.

O Grupo Clarín recusa-se a cumprir o artigo 161 da lei e mantém uma batalha judicial para que não seja obrigado a compartilhar o espaço que ocupa no sistema de comunicações com outras vozes. O artigo é um dos principais instrumentos de desconcentração da propriedade dos meios e de promoção da diversidade e da pluralidade, pois define que cada grupo deve ter, no máximo, 24 licenças de TV a cabo e 10 licenças de serviços abertos (TV aberta, rádios AM e FM). Estabelece, ainda, que aqueles que excederem esse limite devem apresentar um plano de adequação devolvendo as licenças que tiver em excesso para que todos possam ter o direito a ocupar esse espaço que, afinal de contas, é público.

O Clarín possui nada menos que 240 licenças de TV a cabo, 9 de rádios AM, 1 de FM e 4 de TV aberta. Depois de ter vista a falência da estratégia de chamar a lei de meios de “lei mordaça”, dado o amplo apoio popular ao instrumento multiplicador de vozes, o grupo monopólico se resignou a defender que tinha direito de ficar com todas as licenças, mesmo que isso não fosse o mais democrático. O Clarín agora reivindica abertamente o direito de ter o monopólio que adquiriu ao longo da história, porém a história agora é outra.

Mesmo com boa parte do espectro radiodifusor nas mãos do monopólio, a lei já criou um ambiente com uma diversidade de vozes que faz inveja a países como o Brasil. Os números do que já foi feito em 4 anos dão a dimensão da mudança. Desde a aprovação da lei de meios, foram instaladas, na Argentina, 152 rádios em escolas de primeiro e segundo graus, 45 TVs e 53 rádios FM universitárias. Se, no Brasil, os povos originários lutam para não perder direitos constitucionais, no país vizinho eles já passaram a ter o seu primeiro canal na TV aberta e 33 canais de rádio. A posse de meios de comunicação por parte desses povos era proibida antes da nova lei entrar em vigor.

Além de distribuir o espaço de forma mais equilibrada e plural, a lei de meios também começa a transformar radicalmente a economia setor. Mais de 65% do país está coberto por cooperativas de operadoras de TV a cabo e a distribuição gratuita de 1 milhão e duzentos mil codificadores digitais já possibilita a cobertura de 82,5% do território com TV digital aberta. Mais de 4.200 horas de conteúdos e 900 séries de ficção foram produzidas com fomento federal e distribuídas em mais de 30 canais nacionais e estaduais. A Argentina agora conta com 9 polos de produção audiovisual e 100.000 novos postos de trabalho no setor.

Centenas de comunicadores também surgiram nos últimos quatros anos. E para comemorar a política pública que tem tornado efetivo o direito à comunicação e transformado milhões de consumidores em comunicadores ativos não se restringiu a um tradicional ato público, eles foram reunidos no Primeiro Encontro de Comunicação dos Territórios. Nele, compartilharam experiências que estão sendo construídas do extremo norte do país à Patagônia, não mais apenas na cidade de Buenos Aires. O evento aconteceu na antiga Escola de Guerra Naval, hoje transformada no Espaço da Memória e de Defesa dos Direito Humanos. Não há como descrever a emoção de ver os corredores onde 5.000 pessoas foram torturadas, mortas e desaparecidas pela ditadura tomados por pessoas que comemoravam a vitória da democracia. Some-se a isso o fato do espaço não se dedicar apenas à memória, mas também à defesa dos direitos humanos, o que faz dele um espaço vivo que abriga, além do Arquivo Nacional da Memória a Universidade da Madres de Mayo, a produção de um dos canais de TV Públicos e diversas outras estruturas de organizações de ativistas defensores de direitos humanos.

A mesa que abriu os trabalhos estava composta pelo Ministério da Educação, Ministério da Saúde, Ministério do Desenvolvimento Social, Ministério do Trabalho Emprego e Seguridade Social, Ministério de Relações Exteriores, Comissão Nacional de Comunicação e Autoridade de Serviços de Comunicação Audiovisual (AFSCA) e pelo Instituto Nacional de Tecnologia Agropecuária (INTA). A composição nos dá a dimensão do que é trabalhar os diretos humanos como uma política de Estado e não apenas como uma pasta secundária. O INTA é o instituto equivalente à EMBRAPA no Brasil. Se levarmos em conta que foi o INTA o setor que mais mobilizou comunicadores para o evento, conseguiremos entender o que de fato significa construir políticas públicas que considerem a comunicação como direito e não como um negócio comercial. Um país que assume essa postura permite que se torne uma ferramenta importante não apenas para jornalistas e produtores audiovisuais, mas também para camponeses, povos originários e cidadãos.

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*Pedro Ekman é integrante da Coordenação Executiva do Intervozes

(Disponível em: http://outraspalavras.net/outrasmidias/destaque-outras-midias/midia-democratica-argentina-4-x-0-brasil/)

A biometria e o totalitarismo (Mauro Santayana)

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Estranhíssima resolução da Justiça Eleitoral determina coleta de dados físicos dos cidadãos. Medida não tem justificativa razoável e pode prestar-se a fins obscuros e antidemocráticos

Por Mauro Santayana, em seu blog

É necessário refletir sobre Estado, Sistema e indivíduo, neste momento em que o TSE está implementando — por simples Resolução – o Recadastramento Biométrico obrigatório da população brasileira.

Bakunin nos recorda que, na maioria das vezes, a cada aumento da autoridade do Estado, corresponde igual ou maior diminuição da liberdade do cidadão. John Locke, na mesma linha, reflete que a finalidade da justiça – e da Lei – não pode ser nunca a de abolir ou restringir a Liberdade, mas sim, de fortalecê-la e aumentá-la.

E lembra que cada homem é proprietário de sua própria pessoa, e, com relação a ela, a ninguém poderá ser dado o direito de estar acima dele.

Há que se tomar cuidado com a biometria. Os nazistas a usavam para medir o crânio de ciganos e judeus, Mengele arrancava os olhos de crianças gêmeas para classificá-los pela cor da íris. Membros masculinos de prisioneiros de campos de extermínio eram amputados e guardados em vidros, cheios de formol, no “museu” de biologia racial de Munique.

O objetivo era catalogar e separar – como se fosse possível em compartimentos estanques – toda a herança genética humana estabelecida pelo acaso, durante milhares de anos.

No mundo inteiro, as mentes mais lúcidas estão se perguntando qual será o próximo passo, no controle do indivíduo pelo Sistema. Os governos espionam nossas comunicações. Softwares de reconhecimento facial são usados para reconhecer-nos na multidão. Sinais de celular são usados por drones para localizar, via satélite, seus alvos, matando, no processo, dezenas de civis inocentes.

Quando o Estado nos obrigará a deixar que nos registrem o fundo da pupila, ou recolherá o DNA de nossas bocas?

O que será feito desse banco de dados, quando concluído? Há poucos meses, não fosse pronta intervenção da Ministra Cármen Lúcia, dados pessoais de todos os eleitores brasileiros teriam sido entregues, graciosamente, pelo TSE, ao Serasa, instituição privada de controle de crédito.

O que irá ocorrer se a polícia pedir uma cópia desses arquivos? O cidadão saberá que dados recolhidos para fazer seu novo título poderão ser usados um dia contra ele? E se formos invadidos por outro país, ou, por causa de uma tentativa de golpe, voltarmos a mergulhar no autoritarismo?

Onde se esconderão nossos heróis, no futuro, se os repressores puderem identificar qualquer um, em segundos, com um simples toque do dedo de um suspeito, na passagem de uma barreira ou no meio de uma manifestação?

Quantos inocentes não teriam sido capturados, antes de conseguir escapar da Europa nazista, caso seus algozes tivessem acesso à internet, a um scanner de dedo e a um banco de dados como esse?

A essência da democracia está na possibilidade de se resistir ao Sistema quando o Sistema erra. Cada vez que tolhemos e aumentamos o controle sobre o indivíduo, fazemos o mesmo com nossos filhos e netos, e com o destino da liberdade, amanhã.

(Disponível em: http://outraspalavras.net/outrasmidias/destaque-outras-midias/a-biometria-e-o-totalitarismo/)

Janelas envidraçadas, novo gerador de energia limpa?

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Empregando novo material, cientistas chineses mostram que é possível manter a transparência do vidro e, ao mesmo tempo, convertê-lo em captador solar

No Jornal GGN

Cientistas da Academia Chinesa de Ciências desenvolveram uma tecnologia que torna “inteligentes” as janelas de edifícios, fazendo com que se adaptem às condições climáticas externas para armazenar e gerar energia para o prédio. O projeto pode reduzir os custos de refrigeração e aquecimento em um mundo cada vez mais dependente de energia e carente em recursos.

Enquanto as janelas atuais se limitam regular a entrada da luz do Sol no ambiente interno, as janelas “inteligentes” usam os raios solares para armazenar energia, que é desperdiçada com as comuns, explica o cientista Yanfeng Gao, coautor do estudo. “A principal inovação deste trabalho é que ele desenvolveu, simultaneamente, um conceito de dispositivo de janela inteligente de geração e economia de energia”, afirma.

São antigas as tentativas de engenheiros de incorporar painéis solares de captação de energia em janelas, mas sem afetar a sua transparência. A equipe de Gao descobriu um material chamado de óxido de vanádio (VO2), que pode ser usado como um revestimento transparente para regular a radiação infravermelha do sol. O VO2 altera as suas propriedades com base na temperatura. Abaixo de um determinado nível se torna isolante e deixa passar a luz infravermelha, enquanto que, na outra escala de temperatura, torna-se refletora.

A janela na qual o óxido de vanádio foi utilizado nos testes regulou a quantidade de energia do Sol que entrou no edifício, assim como também o fez para a dispersão de luz por meio das células solares que a equipe de pesquisa havia instalado em torno de seus painéis solares. Nos testes, foi possível manter acesa uma lâmpada.

“A janela inteligente combina a economia de energia e geração em um único dispositivo, e oferece potencial de inteligência para regular e utilizar a radiação solar de forma eficiente”, afirmam os autores da pesquisa em artigo publicado na revista científica Reports.

When Health Isn't the Top Priority (Abraar Karan)

Hoje li este texto no Medscape e fiz um comentário sobre ele (que compartilho em seguida). Muito bom para refletirmos!!

By Abraar Karan at http://boards.medscape.com/forums/?128@@.2a59ee2d!comment=1:

During a presentation I attended earlier this week on how we can influence patients’ health through preventative measures and essentially working beyond the clinic, a very interesting notion came up regarding the idea of health versus freedom. As healthcare practitioners, we often focus on health as the number one priority for our patients. However, for patients, I would argue that freedom is far more important than health.

This notion may not be apparently conflicting, so let me explain: in the speaker’s presentation, a central argument was that people can control their health if they control their food consumption. He mentioned that, for instance, in African American communities, it is customary to consume a sweet beverage with a guest. “Why not consume an unsweetened tea instead?”, he questioned the audience. A student quickly responded with the practical answer: offering an unsweetened tea to a guest would be a cultural taboo in his community. For this young man, offering a sweetened beverage to his guest was more important in terms of what made his life meaningful than avoiding a few extra calories. It was his freedom to drink something a little unhealthy, but to enjoy it with a friend, that he valued more than his absolute health outcome, whatever that may end up being over the course of his life.

I noticed this idea of freedom and how important it is many years earlier as well when I worked in Uganda with HIV/TB co-infected patients in a research institute. Women who presented with care were counseled on the high risk of transmission to any future fetus, and were essentially being persuaded to avoid having children, which in terms of halting the spread of the HIV epidemic would seem advisable.

But to view the situation so narrowly is to lose what is humanism — for these women, having a child was central to their existence, far more important than their serostatus. It was apparent to me that of course these mothers would do everything to prevent their baby from contracting the virus, but they weren’t about to avoid having a baby altogether to do so.

And so for all of us future physicians, it is critical that we remember that health is not everything — a person’s clinical outcome is but a fraction of who they are, what they want, and what makes them happiest.

Follow me @SwasthyaMundial for more healthcare reflections!

Meu comentário sobre o texto do Mr. Karan:

Mr. Karan

Wonderful text, congratulations!

Well... Reading your text, I thought about Alma Ata and its health definition as "a state of complete physical, mental and social well-being and not merely the absence of disease or infirmity".

So it is not health against social and psyco; but the comprehension that social and psyco issues are also about health.

Then i believe that health is really everything, but it's our comprehension and practices as medical doctors (or students, like me) of health that always are not so healthy for the patients. The biomedical thinking always let us to those reflexions, but i believe that liberty and all other ethic issues are also about health, and not just disease or physical matters.

I am Medical Student in Brazil and it would be awesome make contact with you, to share some thoughts about Medicine and Society. My e-mail is cslucass@gmail.com feel free to send me a message.

Regards

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Assim os ricos evitam impostos (Clair Maria Hickmann, Dão Real dos Santos e Marcelo Ramos Oliveira)

(Disponível em: http://outraspalavras.net/outrasmidias/capa-outras-midias/assim-os-ricos-evitam-impostos/)

Breve roteiro para começar a compreender três mecanismos principais da fuga fiscal: leis que privilegiam, comércio exterior fraudulento e paraísos fiscais

Por Clair Maria Hickmann, Dão Real dos Santos e Marcelo Ramos Oliveira* no Le Monde Diplomatique Brasil

A demanda por recursos públicos é cada vez maior. A briga pela apropriação do “bolo” é quase uma guerra. Nas recentes manifestações públicas brasileiras, surgiram novas e diversas demandas, desde o “passe livre”, saúde, educação, até melhorias do serviço público em geral. A resposta dos governantes é sempre a mesma: “Não há recurso público”. Mas será que realmente não existem recursos suficientes para atender às demandas da sociedade?

Inicialmente, cabe dizer que a aplicação e a origem dos recursos públicos são sempre uma decisão política. Ao governo cabe dizer onde os recursos serão investidos, e isso também significa dizer onde não serão aplicados. Cabe igualmente ao governo dizer de onde e de quem os recursos serão retirados, e de quem não serão cobrados, ou seja, quem vai e quem não vai pagar a conta. E governo aqui deve ser lido em sua acepção mais ampla, envolvendo todo seu conjunto de instituições. Trata-se, enfim, de uma opção política.

Uma alternativa para aumentar os recursos públicos disponíveis é fechar seus diversos ralos. No lado dos gastos e despesas, é necessário melhorar o controle e a gestão da coisa pública para evitar desvios com corrupção, além de melhorar a qualidade da alocação dos recursos. Já no lado dos ingressos, é urgente combater os buracos negros no campo tributário, que fazem que muitos recursos públicos deixem de ingressar nos cofres estatais.

Vejamos, portanto, alguns ralos do dinheiro público no campo tributário. Estes  ocorrem em no mínimo três dimensões. A primeira está no espaço da legalidade formal, em que leis e outras peças normativas exoneram as classes mais abastadas de contribuir com o custo do Estado. Outra se refere aos mecanismos de evasão ou elisão que proporcionam tantos espaços para os planejamentos tributários, sobretudo pela desregulamentação dos fluxos internacionais comerciais e financeiros, paraísos fiscais e países com tributação favorecida. Há ainda uma terceira dimensão, que compreende os mais variados mecanismos técnicos que impedem ou dificultam a cobrança dos créditos tributários devidamente lançados. Esse terceiro aspecto envolve ainda a dificuldade de manutenção dos créditos nas esferas de julgamento e os diversos artifícios de “blindagem patrimonial” usados por devedores “poderosos”.

Cada uma dessas três dimensões, embora se materialize de forma distinta no campo fático, decorre de uma mesma causa e produz efeitos convergentes. A submissão da política aos interesses daquelas minorias privilegiadas que detêm a maior fatia das riquezas sociais produz a apropriação do público pelo privado, perpetuando um círculo vicioso difícil de ser quebrado e que pode ser representado na expressão “tem poder quem tem dinheiro e tem dinheiro quem tem poder”. O efeito, portanto, não poderia ser outro senão a ampliação contínua das brechas e dos mecanismos para que esses setores não sejam alcançados pela tributação. Segundo Antonio David Cattani, em A riqueza desmistificada (Marcavisual, 2013), “corporações e indivíduos em condições socioeconômicas privilegiadas, em especial os super-ricos, têm capacidade de manejar uma série de expedientes que lhes permitem não obedecer aos regramentos válidos para todos, [...] elisão e evasão fiscais, ocultação de bens são práticas mais facilmente utilizadas por aqueles capazes de usar seus incomensuráveis recursos para evitar que a tributação estatal recaia sobre suas fortunas”.

A dimensão da legalidade define formalmente a abrangência da “mão” do Estado, aonde e como ela pode ir com o intuito de buscar os recursos que financiem sua atuação. É nessa dimensão que as classes dominantes constroem os conceitos ideológicos que regerão e dominarão a sociedade. Um exemplo disso é a contestação geral de que a carga tributária, atualmente em torno de 35% do PIB, é muito alta, o que reforça em todos uma ideia de consenso a legitimá-la, levando a crer que todos os brasileiros pagam em torno desse percentual. Todavia, vemos que a carga não recai uniformemente, mas, de modo paradoxal, concentra-se sobre as camadas menos aquinhoadas da sociedade.1 É difícil explicar, segundo princípios de equidade e de justiça fiscal, que alguns tipos de renda tenham tratamento diferenciado simplesmente em razão de sua origem. É o caso da isenção do Imposto de Renda na distribuição de lucros e dividendos. Por outro lado, rendimentos oriundos do trabalho são tributados normalmente.

Renúncia fiscal – JCP

Entre tantos casos de construções legais de renúncias e benefícios fiscais, escolhemos escrever nesta edição sobre a dos juros sobre o capital próprio (JCP). Esse mecanismo permite que as empresas paguem a seus sócios juros sobre o capital investido, criando com isso uma despesa fictícia na pessoa jurídica que reduz o lucro tributável de Imposto de Renda e da contribuição social sobre o lucro em 34%. Além disso, o acionista contemplado com a distribuição dos JCP é privilegiado ao ser tributado com uma alíquota única de 15% de Imposto de Renda na fonte. No final dessa conta, há uma renúncia fiscal de 19% no recolhimento de Imposto de Renda. Trata-se, na verdade, de uma modalidade de distribuição dos lucros mascarada por um artifício fiscal.

Destaque-se aqui, novamente, o privilégio na tributação do rendimento do capital (juros sobre o capital próprio), que paga apenas 15%, e ainda exclusivamente na fonte, o que quer dizer que esse rendimento não é levado à incidência da tabela progressiva, cuja alíquota chega a 27,5%. Trata-se de mais uma forma “legal” de burlar o princípio constitucional da progressividade, criado para tornar a tributação mais justa.

Nas contas do governo federal, os JCP não são considerados renúncia fiscal. No entanto, é importante esclarecer que, de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, a renúncia fiscal compreende também “alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado”.2

Qual será o valor dessa renúncia fiscal?Seguramente, alguns bilhões. E o valor das outras tantas renúncias e privilégios tributários existentes nas três esferas de governo?

Por que o governo não revela o montante dessas renúncias? A sociedade pode e deve exigir dos governantes a divulgação desses valores. Será necessário o povo ir às ruas para reivindicar a transparência dessas renúncias fiscais que já deveriam ser divulgadas?

Evasão ou elisão fiscal

Uma segunda dimensão é aquela definida pela omissão do Estado em exercer sua jurisdição delimitando as áreas de atuação dos agentes econômicos que se aproveitam para se evadir de suas obrigações tributárias por meio dos mais variados esquemas. O “jeitinho brasileiro” é pródigo em inventar “esquemas” e “interpretações” em que a forma é mais importante que a substância, de modo a possibilitar a fuga dos tributos. O uso de paraísos fiscais, pelos quais transitam apenas papéis para transferir lucros e impostos de um ponto a outro do planeta, é a ponta do iceberg da fuga dos capitais de suas legítimas obrigações tributárias.

Nas exportações

Uma prática muito comum das grandes corporações é criar uma filial ou empresa coligada em um paraíso fiscal e/ou país com baixa tributação e transferir seus lucros para esses locais. Grandes empresas exportadoras de commodities (ferro, soja, sucos) e de outras atividades vendem suas mercadorias para suas próprias filiais, localizadas em paraísos fiscais, a um preço muito baixo, reduzindo o lucro no Brasil. Essas filiais, por sua vez, refaturam o mesmo produto para o cliente final, porém agora a preço de mercado. A mercadoria vai direto ao cliente final, mas o lucro fica na filial brasileira localizada no paraíso fiscal, onde não paga tributo algum ou paga muito pouco. Nesse caso, sob o aspecto formal, o adquirente da mercadoria é uma empresa, por exemplo, da Suíça, mas o destino final da mercadoria é outro país. Os recursos que ingressam no Brasil são aqueles faturados para o paraíso fiscal, e não aqueles que o cliente final efetivamente pagou.

O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC)3 tem divulgado que o maior comprador dos produtos brasileiros é a China, seguido dos Estados Unidos. Mas esse estudo considera que o país comprador é aquele do destino da mercadoria. Contudo, se fosse feito um levantamento para identificar o país adquirente, de acordo com os documentos fiscais, o resultado seria chocante, porque Suíça e Ilhas Cayman, provavelmente, apareceriam como os dois maiores compradores das exportações brasileiras. Para o resultado do comércio exterior, isso pode não ser relevante, mas para os cofres públicos brasileiros representa uma enorme perda de arrecadação tributária.

Bem, você pode dizer que o lucro da filial brasileira no exterior deve ser tributado no Brasil. Sim, de fato, e a legislação brasileira assim prevê. Mas aí começa outro problema que parece interminável: essas corporações interpretam que essa tributação somente pode ocorrer quando o lucro for efetivamente disponibilizado no Brasil (quando será?) e recorreram à Justiça, fazendo que essa discussão se prolongue por mais de dez anos. Sabe-se que a pressão desses grupos é grande para ganhar a disputa e até para mudar a legislação. Alegam que o “Brasil precisa incentivar a expansão das empresas brasileiras no exterior”. Não nos parece que deva ser essa a política do Brasil, quando temos carência enorme de capital e financiamento de infraestrutura.

Nas importações

Nas operações de importação, ocorrem práticas semelhantes, porém em sentido contrário. Grandes empresas, principalmente multinacionais, importam mercadorias, bens e serviços por intermédio de uma companhia vinculada e/ou localizada em um paraíso fiscal. O preço da mercadoria, porém, é superfaturado para aumentar o custo brasileiro e, em consequência, reduzir o lucro tributável. O objetivo final é o mesmo: transferir lucros para um local onde a tributação seja nula ou muito baixa.

Há uma legislação específica de “preço de transferência” que limita essas operações, mas sua aplicação é complexa e muito questionada juridicamente, e as discussões nos tribunais arrastam-se por muitos anos. Vale lembrar que se trata de planejamentos tributários internacionais, elaborados pelas maiores empresas e por grandes bancas de advogados, e a influência desses grupos no meio político e no financiamento de campanhas eleitorais é bastante conhecida.

Além disso, a legislação tributária nunca alcança todas as situações, muitas vezes por falta de vontade política, outras porque as empresas estão sempre criando novos artifícios para burlar o fisco.

Paraísos fiscais, o grande buraco negro mundial

Recentemente, em nível internacional, tanto os países do G20 como os do G8 reconhecem que a exagerada desregulamentação dos fluxos comerciais e financeiros internacionais, promovida pela globalização para dar eficácia à fragmentação dos processos produtivos pelo mundo, tem de fato produzido uma profunda erosão das bases tributárias em todos os países, na medida em que permite que as grandes corporações possam transferir com facilidade grande parte de seus lucros para os paraísos fiscais. Segundo estudos produzidos por organizações internacionais,4 esse fenômeno faz que essas grandes corporações empresariais não paguem mais do que 5% de impostos sobre seus lucros globais obtidos ao redor do mundo, e os estudos visam propor medidas para reduzir esses impactos negativos. Paradoxalmente, na próxima reunião marcada pela Organização Mundial do Comércio, para dezembro deste ano, em Bali, na Indonésia, está prevista a assinatura do Acordo de Facilitação de Comércio Internacional, medida fortemente influenciada pelo interesse das grandes empresas e que objetiva impor aos Estados nacionais inúmeras restrições ao seu poder de controlar ou fiscalizar tais fluxos, dificultando, assim, ainda mais o combate à evasão fiscal.

Limitações administrativas

Finalmente, a terceira dimensão pela qual se esvaem recursos públicos é aquela das limitações definidas na área administrativa. São construções ideológicas, escondidas sob o manto da tecnicidade, que, por exemplo, definem que as administrações tributárias devem ser eficientes e eficazes, acima de tudo sobre os pequenos contribuintes, enquanto relevam ações mais contundentes sobre os maiores. Os créditos tributários lançados enfrentam mil e uma dificuldades para sua conversão em recursos recolhidos. As infindáveis possibilidades de recursos administrativos e judiciais é um dos grandes problemas: o contribuinte pode recorrer a diversas instâncias administrativas e depois ainda discutir a causa na Justiça. Com isso, as cobranças arrastam-se por mais de quinze anos. E, quando finalmente a dívida é cobrada, o devedor já não tem mais patrimônio em seu nome ou o transferiu para algum paraíso fiscal, o que no mercado é conhecido como “blindagem patrimonial”. Outra dificuldade é a inimputabilidade penal pelo pagamento, o que significa que, caso o sonegador seja autuado pelo fisco, ele pode pagar a dívida e então seu crime deixa de ser crime. Aliás, não precisa nem pagar tudo, pode parcelar.

Conclusão

Os elementos apresentados aqui são apenas parte dos inúmeros mecanismos legais, estruturais, culturais e jurídicos que não fazem outra coisa que não colocar uma parcela significativa das riquezas a salvo de qualquer tributação, desmentindo o clássico aforismo de Thomas Fuller, de que por mais alto que se esteja, a lei sempre estará acima, como demonstra Cattani. A dificuldade de cobrar tributos daqueles com maior capacidade contributiva ou a opção política de não fazê-lo fragilizam a capacidade dos Estados de promover políticas públicas voltadas para o bem comum, seja, de um lado, pela falta de recursos, ou, de outro, pela necessidade de adotar a alternativa mais fácil de construir e manter um sistema tributário altamente regressivo, baseado em tributos sobre o consumo que, comprovadamente, retiram a maior parte dos recursos das classes que mais necessitam, aumentando a desigualdade e a precarização das condições de vida dos mais pobres e forçando a alocação dos gastos sociais muito mais para ações compensatórias do que para promover acréscimo de bem-estar.



*Clair Maria Hickmann: Membro do Instituto de Justiça Fiscal (IJF - www.ijf.org.br)

Dão Real dos Santos: Membro do Instituto de Justiça Fiscal (IJF - www.ijf.org.br)

Marcelo Ramos Oliveira: Membro do Instituto de Justiça Fiscal (IJF - www.ijf.org.br)



1 Fátima Gondim Farias e Marcelo Lettieri Siqueira,“Bases tributárias brasileiras: penalizando os pobres e beneficiando os rentistas”. In: A sociedade justa e seus inimigos, Tomo, Porto Alegre, 2012.
2 Lei Complementar n. 101/2000, em seu art. 14, § 1o.
3 Ver: .<www.mdic.gov.br/arquivoswnl_1365787109.pdf>.
4 Nesse sentido, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), em julho de 2013, divulgou seu relatório de proposição de ações denominado “Action plan on base erosion and profit shifting” [Plano de ação sobre erosão na base e deslocamento de lucros]. Disponível em: .<http://dx.doi.org/10.1787/9789264202719-en> . Ainda que o assunto seja complexo, as organizações sociais ligadas ao tema da justiça fiscal têm sérias críticas à limitação de sua abrangência.

E se os testes de cosméticos fossem feitos em humanos? (Carlos Merigo)

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Uma instalação em Londres questiona: Vale a pena criar novas marcas de batom ou rímel, se o preço for infligir sofrimento constante aos animais?
Por Carlos Merigo, no B9
Quando se fala nos testes que a indústria de comésticos pratica em animais, muita gente vira a cara, acha exagero ou manda logo um jocoso “oh, que dó. você está com peninha dos animaizinhos fofinhos?”.
O problema é que a verdade é muito mais cruel do que se imagina. Diversas marcas já aboliram esse tipo de teste, mas outras tantas continuam fazendo.
Para escancarar essa barbárie do especismo, a marca Lush criou um laboratório de experimentação na vitrine de uma de suas lojas em Londres. Só que ao invés de animais, colocou uma mulher como cobaia.
Mesmo sendo de mentirinha, as imagens chocam. Com isso, a Lush conseguiu chamar atenção para a causa e para os seus produtos, numa “instalação de arte” que durou 10 horas.
A pergunta é: Vale a pena ter mais uma nova marca de batom, rímel, desodorante ou produto de limpar fogão no mercado, ao custo de enfiar isso olho e goela abaixo dos outros?
Para ajudar na sua decisão, aqui vai duas listas: Uma de empresas que testam em animais| E outra das que não testam.

Coragem disfarçada de avó (Ana Aranha)

Faz voz fina e mimos para netos. Criou sozinha seis filhos. Enfrentou ditadura, latifúndio e pistoleiros. Está na luta contra trabalho escravo

Crônica de Ana Aranha, no blog 3 por 4

Não se engane, como eu, com o sorriso aí de cima. Quando conheci Maria Oneide Costa Lima, de 62 anos, ela fazia voz fina e mimos para alegrar um de seus muitos netos. Arrastando o chinelo, com fala mansa e riso fácil, parecia uma senhora tranquila em seu papel de avó. Observando-a ali, na intimidade da casa, não poderia desconfiar da bravura que essa senhora carrega na bagagem.

Oneide é uma daquelas pessoas que tem História com “h” maiúsculo. Sentada nos fundos da casa onde criou sozinha os seis filhos, ela desfiou sua trajetória pontuando cada capítulo com um sorriso. Como se fossem causos de menina travessa, contou episódios perigosos e cruéis que enfrentou no sul do Pará nas décadas de 70 e 80. Histórias do tempo em que era perseguida por pistoleiros, ameaçada por fazendeiros e vigiada pelo regime militar.

Seus filhos brincam que algumas bravuras da mãe são “coisa de gente doida”. Mas sentem orgulho e, de diferentes formas, buscam uma trilha parecida. Nem ela sabe explicar de onde tirou ousadia para algumas das reações que teve às ameaças da vida. Uma delas foi quando tinha 20 anos e ouviu a voz de um homem, dentro de sua casa, jurando de morte o seu marido. Os dois homens estavam sentados na sala e Oneide ouviu a conversa do quarto. Ela buscou a espingarda velha, tirou o pó, entrou na sala com cara de braba e deixou a arma apoiada na parede, ao alcance do marido. “Aquela espingarda não atirava há anos, mas podia servir pra alguma coisa, nem que fosse pra bater na cabeça do pistoleiro”, ela brinca. E, como faz quase sempre que fala do marido, suspira: “Eu tinha muito medo de perder ele, dizem que os bons não duram”.

Seguindo a sua lógica, Raimundo Ferreira Lima, conhecido como Gringo, deve ter sido um homem muito bom. Pois foi assassinado aos 43. Gringo era ameaçado por ser o líder do sindicato dos pequenos agricultores de Conceição do Araguaia. Quando eles se casaram, ele ainda não era envolvido com o sindicato. Ela tinha 16 anos, ele 30. Como era muito menina, ganhou o apelido de Pituca. O apelido dele veio da sua época de escola: magro e baixinho, a turma caçoava que ele parecia um “grilo”. Mas, brigão desde sempre, ele apelava com os colegas que faziam a brincadeira e esses foram obrigados a inventar o “Gringo”.

Oneide se encantava pelo interesse do marido pelo conhecimento. “Era um homem inteligente, letrado”, ela diz, entre mais suspiros. Ele trabalhava como gerente de uma fazenda, até o dia em que o dono mandou expulsar os posseiros, pequenos agricultores que moravam nas fronteiras da propriedade. O fazendeiro queria expandir suas terras. Gringo não só se recusou a executar a ordem e pediu as contas, como o episódio lhe fez despertar para as injustiças dos conflitos de terra. Buscou trabalho na Comissão Pastoral da Terra (CPT), entidade ligada à igreja Católica que auxilia os trabalhadores do campo.

Menos de um ano depois da demissão, foi eleito líder do sindicato dos pequenos agricultores. Mas, ao ensinar os direitos aos pequenos, Gringo despertou a ira dos grandes: os fazendeiros, políticos e militares – instâncias cujas fronteiras eram invisíveis no Brasil do governo militar e ainda se misturam no Brasil de hoje.

Na manhã em que o marido foi encontrado agonizando com três balas no corpo, Oneide correu para o local, mas ele já não tinha vida. Ela reagiu com luta: quase foi presa porque insistia em ela mesma colher as provas do crime. Sabia que, se deixasse a polícia “fazer seu trabalho”, os matadores nunca seriam encontrados. Sob ameaça de prisão, foi retirada à força do local. Anos depois, o caso foi arquivado por falta de provas.

Sozinha com os seis filhos, que tinham entre nove meses e 12 anos, a reação de Oneide surpreendeu muita gente. Ao invés de se afastar da causa que roubou a vida do marido, mergulhou de cabeça nela. Aproximou-se da Pastoral da Terra e passou a fazer formação política e de orientação sobre os direitos da população nas comunidades rurais à beira do rio Araguaia. Logo entrou para a lista de pessoas “monitoradas” pelo governo.

Sempre que algum conflito estourava entre posseiros e fazendeiros, ela e os padres da CPT eram os primeiros suspeitos. Oneide chegou a ficar 72 horas em prisão domiciliar. Certa vez sua casa foi invadida pela polícia, que levou todos os álbuns de fotos da família.

Uma das imagens “confiscadas” apareceu em panfleto jogado de avião sobre as comunidades rurais onde Oneide atuava. Nele, lia-se que ela usava o dinheiro da igreja para fazer festas e orgias. “As pessoas não sabiam ler e guardaram a foto, achando que era uma homenagem”, Oneide ri. “Quando eu chegava, elas corriam pra mostrar o papel com minha imagem. Aí eu lia o que estava escrito e elas rasgavam no meio”.

As vizinhas ralhavam com a amiga, pediam para “aquietar”. “Naquela época, as pessoas tinham muito medo de falar sobre política. Eu não tiro a razão, depois de tudo que vimos acontecer aqui durante a guerrilha”. Muitos comerciantes de São Geraldo do Araguaia (nome do município criado no local onde Oneide mora) foram perseguidos por vender produtos aos membros da guerrilha do Araguaia – movimento que pretendia derrubar o governo militar pela luta armada. “Teve um comerciante que foi encontrado morto com marcas de algema, ele tinha sido acusado de vender produtos para a Dina”, ela lembra, referindo-se à Dinalva Conceição Oliveira Teixeira, uma das guerrilheiras cujo corpo nunca foi encontrado.

Oneide só recuou da sua luta quando as ameaças chegaram a sua família. Ela recebeu o seguinte recado: se continuasse auxiliando os posseiros, os seis filhos teriam o mesmo destino do pai. “Disseram que matavam todos na casa, até as galinhas”. A imagem lhe assustou pois ela sabia que era factível. Afastou-se do trabalho na pastoral, deixou de ir nas reuniões com as comunidades rurais e, por dez anos, vestiu a camisa do silêncio.

“Que está acontecendo, mãe?”, os filhos perguntavam. “Tá quieta, nem parece a senhora”. Vê-se pelas carreiras trilhadas pelos filhos que eles também carregam o espírito combativo dos pais. Um é sociólogo, outro é líder sindical e uma das filhas é professora. O mais bravo virou sargento “para vingar a morte do pai”, mas foi demovido da ideia.

Ela passou a investir só na carreira de educadora. Brigou até convencer a prefeitura a abrir um colégio com o nome do seu marido. Hoje é diretora da Escola Municipal Raimundo Ferreira Lima. Há poucos anos, encontrou um jeito diferente para retomar as questões do campo. Procurou financiamento de um projeto da ONG Repórter Brasil que trata dos direitos dos trabalhadores rurais. Os professores de sua escola receberam formação para inserir nas aulas uma questão que gera bastante polêmica na atualidade: o trabalho escravo contemporâneo.

O tema provocou controvérsia na escola, onde há funcionários ligados a gerentes de fazendas. Além de incomodar os políticos locais que são fazendeiros e exploram a mão de obra até onde podem. Mas também despertou os alunos, que trouxeram as histórias dos pais que são peões de fazenda e levaram informações para casa. Outros descobriram que tinham direito ao fim-de-semana de descanso e criaram um sindicato para representar os jovens que trabalham como caixa nos mercados da cidade.

Assim, dez anos depois, a Oneide briguenta refloresceu. “Quando li o tema do projeto, pensei: ‘É isso que vai me trazer de volta’”.

Depois de conhecer a brabeza que pulsa por traz da voz doce de Oneide, nunca mais vou olhar uma senhora do mesmo jeito. O sorriso das avós pode esconder muito mais força do que nós, “jovens”, jamais teremos.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

O vagão para mulheres só anda para trás (Marília Moschkovich)

(Disponível em: http://outraspalavras.net/destaques/o-vagao-para-mulheres-so-anda-para-tras/)

Segregar transporte público é sugerir, como outrora, que mulheres são culpadas pela própria sexualidade – e pela dos homens…

Por Marília Moschkovich, na coluna Mulher Alternativa

No Rio de Janeiro já funciona há 7 anos, no metrô, um vagão exclusivo para mulheres. Desde o meio deste ano, o metrô do DF adotou a mesma medida e um projeto de lei tramita no estado de São Paulo para que o mesmo seja feito. O “vagão rosa”, como é conhecido em alguns lugares, já foi implementado no Japão, Egito, Índia, Irã, Indonésia, Filipinas, México, Malásia e em Dubai. Geralmente funcionam assim: nos horários de pico apenas ou prioritariamente mulheres podem ocupar o espaço do vagão. Isso garantiria, a princípio, que não fossem assediadas nos trens.

O fato de apenas países de cultura sabidamente machista terem implementado esse tipo de política pública não é uma coincidência. Observando um pouco mais de perto a questão, fica claro que além de não resolver nada e reforçar a heteronormatividade e o próprio machismo, os vagões exclusivos ainda fomentam uma outra forma de opressão de gênero. Acompanhem meu raciocínio.

Assédio, em todos os níveis

Quem nunca viveu ou viu uma situação de assédio em transporte público lotado? Em geral os assediadores aproveitam-se da superlotação dos trens para agir. Na cabeça dessas criaturas bizarras, as mulheres são corpos disponíveis, que existem no mundo para agradá-los. Essa é a faceta mais perversa do machismo estrutural, reproduzida e reforçada por homens que muitas vezes, na melhor das intenções, se dizem feministas: a ideia de que eles podem pautar o corpo e o comportamento das mulheres de alguma forma. Esse princípio está por trás de textos machistas do escritor Xico Sá, de versos de Vinicius de Moraes, mas também orienta ações como a de estupradores e assediadores (físicos e verbais) em todos os dias de nossas vidas.

Recentemente a força que esse princípio tem na cultura brasileira ficou evidente, quando os resultados da campanha “Chega de Fiu-Fiu”, do blog ThinkOlga, foram divulgados. Houve muita resistência de diversos homens em aceitar que aquela cantadinha que parece inofensiva acaba limitando a liberdade das mulheres de andarem como quiserem, por onde quiserem, na hora que quiserem. A grande maioria se recusa ainda a entender que nós mulheres não queremos sua opinião sobre como nos vestimos, sobre nossa aparência física, exceto em alguns contextos muito específicos. Quer dizer: novamente, as mulheres existem para os homens, na cabeça de tais espíritos sem luz.

O assédio é frequente, em diversos níveis. Qualquer mulher sabe disso, na pele. Então por que uma medida que (em tese) visa combater o assédio é mal-vista por tantas feministas? As feministas endoidaram de vez?

Os problemas da política dos vagões exclusivos

Para o azar de quem nos odeia, nós feministas ainda não perdemos de vez o bom senso. Vejam só: ao propor a separação de homens e mulheres como solução para o assédio, a política dos vagões exclusivos pressupõe três coisas – e é nessas três coisas que reside a opressão de gênero da questão.

Em primeiro lugar, os vagões exclusivos culpabilizam as mulheres pelo próprio assédio. A questão é abordada como se elas fossem o problema da coisa toda. Essa pressuposição fica clara na ideia de que as mulheres devem ser separadas da “população normal” (ou seja: homens; vejam lá Simone de Beauvoir com seu Segundo Sexo). Separar as mulheres – que são em geral as vítimas da agressão – significa dar liberdade aos algozes.

Quer dizer, os homens que assediam podem continuar assediando em outros espaços, sem que isso tenha nenhum tipo de punição. São comuns os relatos de recusa da segurança do metrô – e das polícias civil e militar – em tomar providências em casos de assédio. Muito comuns. Não é preciso ser nenhum gênio para encontrá-los no bom e velho Google (fica a dica).

Ao mesmo tempo as mulheres, que sofrem as agressões, são confinadas a um espaço limitado. Quer dizer: além dos assédios que limitam nossa liberdade, as políticas públicas que deveriam combatê-los fazem o mesmo. Não faz o menor sentido, não tem a menor lógica. Para sermos livres precisamos ser menos livres – é isso, mesmo?

Esse tipo de inversão cruel e bizarra acontece em várias outras situações de culpabilização das mulheres. Nas sociedades de cultura machista como a nossa, as mulheres são culpadas pela própria sexualidade – e pela sexualidade dos homens também. Assim, quando sofrem agressões, a solução é limitar, fiscalizar e controlar o corpo e as atitudes delas. Jamais o comportamento dos homens.

Daqui derivamos mais uma pressuposição problemática das políticas de vagões exclusivos: a de que seria natural dos homens não se controlarem sexualmente. Essa pressuposição é problemática em todos os níveis possíveis. Pra começo de conversa, porque trata o assédio e o estupro como se fossem parte do sexo, como se estivessem relacionados a desejo sexual e não a uma opressão e a uma questão de poder (três textos excelentes sobre isso, se você ainda não leu: no Biscate Social Club, na revista Fórum e no Bidê Brasil).

Além desse problemão, a proposta de segregar vagões nos diz que o fato de alguém “ser homem” (o que quer que isso queira dizer – falo brevemente disso em seguida) faz com que necessariamente vá assediar e estuprar mulheres. Não preciso dizer o quão irreal é essa suposição, certo? Há muitos homens que não estupram e um bom tanto que não assediam, nem o farão ao longo de sua vida. Só não arrisco dizer que são maioria ou minoria porque, de fato, não há dados estatística e sociologicamente confiáveis sobre isso (lembrando que ser condenado criminalmente por algo não significa que a pessoa realmente fez, nem que quem não foi condenado deixou de fazer).

Ainda mais fora da realidade do que isso, é a terceira suposição implícita nas políticas de vagões exclusivos para mulheres: a de que homens necessariamente têm desejo sexual por mulheres, e vice-versa. Chamamos essa pressuposição de “heteronormatividade”, e ela aparece também em vários outros contextos em nossa sociedade.

Separar as mulheres dos homens no transporte público, além de tudo que já mencionei, ainda reforça essa ideia retrógrada e surreal de que a heterossexualidade e heteroafetividade são o “normal”, o “natural”, e de que relacionamentos gays e lésbicos são exceção, aberração, etc. Ou seja, no fim das contas, políticas como essa do vagão exclusivo estão muito mais para Marco Feliciano do que para Simone de Beauvoir. Sacaram?

Ao criar esse vagões, assumimos que não haverá “desejo sexual” (ainda supondo que seja essa a questão do assédio – que, sabemos, não é) entre mulheres. Nem entre homens. Fingimos que também não existem vários tipos de assédio contra outras minorias no transporte público e no resto da sociedade brasileira (quem lembra de um adolescente que foi jogado de um trem por skinheads que encasquetaram que ele era gay, há uns anos atrás, em São Paulo?). Não vou nem me atrever a tocar na questão dos estupros corretivos a gays e lésbicas.

Dentro dessas minorias outras, talvez a que mais de ferre com essa separação dos vagões sejam os homens e mulheres trans*. Além dessas três suposições problemáticas das políticas de vagões exclusivos, então, temos mais um problema grave que elas alimentam: como definir quem é mulher e quem não é? Quem tem esse poder?

Na semana passada, uma mulher foi expulsa do vagão exclusivo no metrô do DF porque os seguranças do metrô “decidiram” que ela não era mulher. A definição dessa categoria – “mulher” – não é nada simples, e filósofas, antropólogas e militantes feministas de diversas áreas e profissões debatem exaustivamente a questão há décadas. Certamente na legislação dos vagões não há uma definição sequer sobre o que qualifica alguém de “mulher” e portanto dá acesso ao tal vagão exclusivo.

A classificação acaba sendo feita arbitrariamente pela aparência, portanto. Mas é a aparência que define se alguém é ou não é mulher? Definitivamente, não. O que define o gênero das pessoas é a identidade que cada um constrói para si com o passar dos anos. Dar aos seguranças do metrô o poder de definir quem é mulher, é retirar de cada um a possibilidade de viver sua identidade e sua expressão de gênero. É uma forma de dominação das mais abusivas e cruéis.

Sem nem entrar na discussão de que a identidade de gênero não precisa ser binária (homem ou mulher), e nem fixa para a vida toda, já temos bastante motivo ver que os vagões exclusivos são uma violência contra quaisquer pessoas que não sejam homens cissexuais, de aparência e comportamento lidos como suficientemente “masculinos”.

O vagão exclusivo para mulheres é, portanto, um retrocesso para as relações e opressões de gênero de todos os tipos, já tão consolidadas na cultura brasileira. Tudo o que não precisamos agora, enquanto tramitam o estatuto do nascituro e outros absurdos no Congresso, é de retrocesso.

Educar para o trabalho ou para o convívio?

(Disponível em: http://outraspalavras.net/destaques/educar-para-o-trabalho-ou-para-o-convivio/)

Criada há nove anos, comunidade em Porto Alegre repensa agora formação de suas crianças, para valorizar singularidades e superar concepções produtivistas

Por Katia Marko, na coluna Outro Viver | Imagem: Cândido Portinari, Cambalhota (1958)

A Comunidade Osho Rachana comemora nove anos de existência este mês. Durante este tempo, experimentamos diferentes formas de conviver. Algumas pessoas que ajudaram a construir o projeto já não estão mais; outras, chegaram. Crianças nasceram. Novos sonhos foram despertados. Um deles vem sendo gestado há alguns anos: a possibilidade de uma outra educação para nossos filhos.

A primeira vez que a bailarina Ana Thomaz esteve conosco foi há três anos. Na época, a semente da ideia da desescolarização foi plantada. No início do mês, ela retornou com suas duas filhas e criou um turbilhão em nossas mentes e corações. Sua simplicidade, autenticidade e paixão nos tocaram profundamente. Foi uma semana de muito debate, descobertas e reavaliações.

Ana vem aplicando a desescolarização com seus filhos, sem a pretensão de criar um movimento ou convencer multidões da sua verdade. Mas ao observar a doçura, inteligência e solidariedade de suas meninas, comprova-se a veracidade da sua prática. Segundo ela, o princípio da desescolarização é a valorização das singularidades. “É na singularidade que aceitamos a diferença e nos unimos verdadeiramente, sem interesses, muletas, especulações. É na diferença que a vida acontece de modo potente”, explica.

Uma das principais críticas que Ana Thomaz faz à escola é a constituição de corpos impotentes. Crianças que vão perdendo a vitalidade e a alegria, sentadas em classes escolares que não despertam sua criatividade. “Um corpo desequilibrado, descoordenado, impotente, cria uma cultura desequilibrada, descoordenada e impotente. Enquanto não reorganizarmos nossa condição biológica, enquanto não colarmos nossa existência à sua força criadora, todas as mudanças em nossa cultura serão só a melhora do que está ruim, e continuaremos a nos destruir, a perder a grande possibilidade da vida plena e potente.”

Inspirada na teoria do biólogo chileno Humberto Maturana, Ana defende que o corpo é a potência. “Não esse corpo que estamos acostumados a pensar, mas um corpo que é o todo, e como sabemos, o todo é mais do que a soma de suas partes. As partes são muitas, pois não temos ideia do que pode um corpo.” Para exemplificar, ela cita: físico, emocional, cognitivo, energético, anímico, espiritual, instinto, intuição, mente, intelecto, consciente, inconsciente, subconsciente, percepção sensorial, percepção cinestésica, e muitas outras “partes” inseparáveis que formam o todo, o corpo.

Segundo ela, se não temos todas as partes ativas, vivas, acordadas, não somos o todo. “Os bebês, as crianças pequenas, mesmo sem saberem de nada, estão inteiras em seus corpos. Em nossa cultura, vamos desinvestindo partes do nosso todo, e assim crescemos pela metade. E se não temos o todo ativado, não temos corpo, só partes dele. Nos tornamos impotentes, e por isso buscamos o poder.”

Instigada pelas ideias apresentadas, fui pesquisar mais sobre a visão do biólogo. Encontrei um artigo de Adriano J.H. Vieira, “Humberto Maturana e o espaço relacional da construção do conhecimento”. O autor explica que, acreditando na perspectiva do humano como integrado com seus pares, biodiversificados, a concepção educacional de Maturana busca resgatar a vida como centro de todos os processos sistêmicos. Do ser humano enquanto sistema que se espraia na cultura, na convivência. Pensa e nos desafia a buscar uma educação que resgate a biocentralidade. O lugar da vida e da amorosidade nos relacionamentos e ações dos viventes.

Na visão de Maturana, um fio condutor que nos ajuda ir refletindo a educação e a prática educativa é a mudança na finalidade da educação, passando da busca mercadológica como objetivo educacional para a melhor qualidade do conviver humano, da qual o trabalho é decorrência, criação e não fim. “A educação sempre é para que. Os grupos humanos, por situações diversas, vão pontuando, consciente ou inconscientemente, seus objetivos do educar”. Para Maturana isso se dá de forma intersubjetiva. Em outras palavras, as ações são construídas nas relações, mas de uma maneira autônoma e partilhada ao mesmo tempo. Atribui grande importância ao relacionar-se, mantendo a responsabilidade do sujeito por suas decisões.”

Estas foram algumas das questões apresentadas por Ana. Ao compartilhar sua vivência, práticas e conhecimentos, muitas lacunas foram abertas, e ainda mais possibilidades. Muito do que ela expôs já faz parte da nossa realidade e busca, em nossas práticas terapêuticas e meditativas. Mas, com certeza, precisamos avançar bastante na relação com as crianças. Afinal, como também defendia Jung, “quem não se envolve, não se desenvolve”. E o medo ou as barreiras que nos impedem de nos envolvermos mais verdadeiramente com nossos filhos nos dizem muito de nós mesmos.

Parto humanizado: protagonismo e amor sem dor (Bruna Bernacchio)

(Disponível em: http://outraspalavras.net/blog/2013/10/21/parto-humanizado-protagonismo-e-amor-sem-dor/)

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Em São Paulo. [Foto: Yuri Catelli /UOL]
Manifestações no fim-de-semana denunciaram modelo obstétrico atual: ele criminaliza profissionais que deixam à mãe o poder de parir
Por Bruna Bernacchio
No último sábado, centenas de mulheres, homens e crianças foram às ruas do país para falar de algo que, como tantas outras lutas sociais, permaneceu silenciado e criminalizado pelo Estado: a humanização do parto. Barrigas pintadas, sorrisos desmaquiados e peitos amamentando revelavam mulheres-mães que não tinham medo de mostrar uma íntima escolha, o ato de parir.
As manifestações ocorreram no Rio de JaneiroSão PauloRecifeCuritibaBrasília,Campinas (SP), Santo André (SP) Juiz de Fora (MG), e em mais 26 cidades. Além de estampar nas barrigas e nos rostos as qualidades do parto humanizado natural (veja infográficos abaixo), as ativistas também queriam denunciar a perseguição que profissionais do parto humanizado —  como doulas, obstetrizes e enfermeiras obstetras estão sofrendo em maternidades do país.
“O nosso ato é para apoiar todos os profissionais que lutam para que a mulher seja protagonista do seu trabalho de parto e, isso faz com que as cesáreas feitas por conveniências médicas não aconteçam”, destacou a funcionária pública Paula Inara, de 38 anos, uma das coordenadoras do Movimento pela Humanização do Parto.
Isso não significa, porém, ser contra a realização de cesarianas. As ativistas reivindicam que a escolha seja, acima de tudo, da mulher; e que se limitem estas intervenções aos casos em que há risco real para mãe ou para o bebê – e não sejam adotadas de forma indiscriminada, como se faz no país.
O Brasil é hoje o campeão de cesáreas no mundo. A taxa chega a 90% no setor privado e quase 50% no setor público. A recomendação da Organização Mundial da Saúde é um índice de até 15%. Reportagem da APública deste ano sintetizou uma série de denúncias e números de casos de violência nos partos medicalizados. Umpesquisa destaca: uma em cada quatro mulheres sofre violência no parto.
O coletivo Marcha Pela Humanização é formado por mulheres, famílias, organizações e profissionais da área que se unem desde o ano passado em movimento único. O objetivo, escrevem em página do Facebook, é “levar informação de qualidade às mulheres; criar demanda por uma assistência ao nascimento digna e baseada em evidências científicas; pressionar autoridades a tomarem medidas para cumprir leis que só estão no papel; e criar outras diretrizes que favoreçam mulheres e profissionais que acreditam na humanização do cuidado a gestantes e recém-nascidos”.
O assunto suscita polêmica. O filme Renascimento do Parto, em cartaz há mais de dez semanas em diversas cidades do país, retrata a realidade obstétrica mundial contrapondo diversos depoimentos — muitos deles, de mulheres que nem sabiam ter sofrido violência no parto. A obra promove também uma reflexão sobre o futuro de uma civilização nascida sem os chamados “hormônios do amor” — liberados apenas em condições de trabalho de parto humanizado.
Há pouco, o movimento alcançou vitória pequena mas importante. O Projeto de Lei do Senado (PLS) 8/2013, de autoria do senador Gim (PTB-DF), foi aprovado no final do mês de setembro. Está desde dia 10 de outubro tramitando na Câmara. O projetoaltera a Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/1990) para incluir a obrigatoriedade de obediência às diretrizes e orientações técnicas e a criação de condições que possibilitem a realização do parto humanizado nos estabelecimentos de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS).
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Antes que eles deixem de existir (Janara Lopes)

(Disponivel em: http://outraspalavras.net/outrasmidias/destaque-outras-midias/antes-que-eles-deixem-de-existir/)

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Em viagem pelo planeta, fotógrafo registra imagens de civilizações ameaçadas — porque são “exóticas” aos olhos do Ocidente e não se submetem a mundo dominado pela mercadoria
Por Janara Lopes, no Ideafixa
O fotógrafo Jimmy Nelson andou pela Etiópia, Indonésia, Papua Nová Guiné, Quênia, Tanzânia, Nova Zelândia, Mongólia, Sibéria, Nepal, China, Vanuatu, Argentina, Equador, Namíbia, Índia, Sibéria e na Península de Chukotka. Tudo isso para registrar todas as tribos que ainda resistem mundo afora, e que estão prestes a se extinguir.
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“Em 2009, meu plano era entrar em contato com tribos isoladas, e com visual único. Eu queria testemunhar as suas tradições, juntar-me a eles em seus rituais e descobrir como o resto do mundo está ameaçando seu modo de vida para sempre. Mais importante que isso, eu queria criar um documento fotográfico estético ambicioso que resistisse ao tempo. Um corpo de trabalho que fosse um registro etnográfico insubstituível de um mundo que está desaparecendo rapidamente.”, conta Jimmy Nelson.
Before They Pass Away (Antes Que Deixem de Existir) é o nome registro rico e cinematográfico que virou livro.
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